quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013









A natureza da igreja

Como reconhecer uma verdadeira igreja?
Quais são os propósitos da igreja?
O que torna uma igreja mais ou menos agradável a Deus?


EXPLICAÇÃO E BASE BÍBLICA

A natureza da igreja
A Definição: A igreja é a comunidade de todos os verdadeiros crentes em todas as épocas. Essa definição entende que a igreja seja composta de todos os que são verdadeiramente salvos. Paulo diz que “Cristo amou a igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25). Aqui a palavra “igreja” aplica-se a todos aqueles por quem Cristo morreu a fim de redimi-los, todos os que são salvos pela morte de Cristo. Mas ela deve incluir todos os verdadeiros crentes de todas as épocas, tanto do período do NT como do período do AT. É tão grande o plano de Deus para a igreja que ele exaltou Cristo a uma posição elevada de autoridade por amor à sua igreja: “Deus colocou todas as coisas debaixo de seus pés e o designou cabeça de todas as coisas para a igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que enche todas as coisas, em toda e qualquer circunstância” (Ef 1.22,23).
O próprio Jesus Cristo edifica sua igreja chamando para si o seu povo. Ele prometeu: ”edificarei a minha igreja” (Mt 16.18). Mas esse processo pelo qual Cristo edifica a igreja é apenas a continuação do padrão estabelecido por Deus no AT, quando ele chamou pessoas para si mesmo para serem uma assembléia adoradora perante ele. Há diversas indicações no AT de que Deus viu seu povo como “igreja”, o povo reunido com o propósito de adorá-lo. Quando Moises diz ao povo que o Senhor lhe havia dito: “Reúna o povo diante de mim para ouvir as minhas palavras, a fim de que aprendam a me temer enquanto viverem sobre a terra, e as ensinem a seu filhos” (Dt 4.10), a LXX traduz a palavra “reunir” (heb. q ¯ ahal) usando o termo grego ekkl¯ esiaz ¯o, que significa “convocar uma assembléia”, um verbo que é cognato do substantivo grego do NT ekkl¯ esia, “igreja”
Não é de surpreender que os autores do NT falem do povo de Israel do AT como “igreja” (ekklēsia). Por exemplo, Estêvão fala do povo de Israel no deserto como “a igreja (ekklēsia) no desertor (At 7.38, tradução do autor). Da mesma forma o autor de Hebreus cita Cristo referindo-se a ele como quem haveria de louvar a Deus no meio da grande assembléia do povo de Deus no céu: “Proclamarei o teu nome a meus irmãos; na igreja (ekklēsia) te louvarei” (Hb 2.12, tradução do autor; o escritor de Hebreus está citando SL 22.22).
Portanto, o autor de Hebreus entende que os cristãos do tempo presente que constituem a igreja sobre a terra estão cercados por uma grande ”nuvem de testemunhas” (Hb 12.1) que abrange retroativamente as épocas do AT, incluindo Abel, Enoque, Noé, Abraão, Sara, Gideão, Baraque, Sansão, Jefté, Davi, Samuel e os profetas (Hb 11.4-32). Todas essas “testemunhas” rodeiam o povo de Deus do tempo presente, e parece apropriado pensar que elas, juntamente com o povo de Deus do NT, sejam a grande “assembléia” espiritual de Deus, ou seja, a “igreja”   Portanto, muito embora haja certamente novos privilégios e novas bênçãos conferidas ao povo de Deus no NT, ambos os usos do termo igreja na Escritura e o fato de que por meio de toda a Escritura Deus sempre chamou seu povo para reunir-se para a adoração do seu nome indicam que é correto entender que a igreja é constituída de todo o povo de Deus de todas as épocas, tanto dos crentes do AT como do NT.

2. A igreja é invisível, todavia visível. Em sua verdadeira realidade espiritual como a comunhão de todos os crentes genuínos, a igreja é invisível. Isso porque não podemos ver a condição espiritual do coração das pessoas. Podemos ver exteriormente os que freqüentam a igreja e observar evidências exteriores de mudanças espirituais interiores, mas realmente não podemos olhar para o coração das pessoas e ver o estado espiritual delas — somente Deus pode fazer isso. É por isso que Paulo diz: “O Senhor conhece quem lhe pertence” (2Tm 2.19). Em nossas igrejas e em nossa vizinhança, somente Deus sabe com certeza (sem margem de erro) quem são os verdadeiramente crentes. Falando da igreja como invisível, o autor de Hebreus refere-se à igreja dos primogênitos, cujos nomes estão escritos nos céus” (Hb 12.23) e diz que os cristãos do tempo presente se juntam a essa assembléia em adoração.
Podemos dar a seguinte definição: A igreja invisível é a igreja como Deus a vê. Tanto Martinho Lutero como João Calvino foram enfáticos em afirmar esse aspecto invisível da igreja contra o ensino de que a Igreja Católica Romana era a única organização visível que descendia dos apóstolos em linhagem ininterrupta de sucessão (por meio dos bispos da igreja). A Igreja Católica Romana argumentava que somente em sua organização visível poderíamos encontrar a verdadeira igreja, a única igreja verdadeira. Mesmo hoje tal pensamento é sustentado pela Igreja Católica Romana. Tanto Lutero como Calvino discordaram dessa idéia, asseverando que a Igreja Católica Romana possuía uma forma exterior, uma organização, mas que isso era apenas uma casca. Calvino argumentou que exatamente como Caifás (o sumo sacerdote do tempo de Jesus) descendia de Arão, mas não era um verdadeiro sacerdote, assim os bispos católicos romanos “descendiam” dos apóstolos segundo a linhagem de sucessão, mas não eram verdadeiros bispos da igreja de Cristo, pois haviam se desviado da verdadeira pregação do evangelho. Logo, sua organização visível não era a verdadeira igreja.
A verdadeira igreja de Cristo, no entanto, certamente também possui um aspecto visível. Podemos usar a seguinte definição: A igreja visível é a igreja como os cristãos a vêem. Nesse sentido, a igreja visível inclui todos os que professam a fé em Cristo e dão evidência dessa fé em sua vida.
Nessa definição, não estamos dizendo que a igreja visível é a igreja que qualquer pessoa no mundo (como um descrente ou alguém que sustenta ensinos heréticos) pode ver, mas estamos falando da igreja como ela é percebida por aqueles que são crentes genuínos e que têm um entendimento da diferença entre crentes e descrentes.
A igreja visível espalhada por todo o mundo sempre incluirá alguns descrentes, e as congregações individuais normalmente incluirão alguns descrentes, porque não podemos ver o coração como Deus vê. Paulo fala de Himeneu e Fileto: “O ensino deles alastra-se como câncer [...] Estes se desviaram da verdade li.] a alguns pervertem a fé” (2Tm 2.17,18). Mas ele está confiante de que “o Senhor conhece quem lhe pertence” (2Tm 2.19). Semelhantemente, Paulo adverte os presbíteros de Éfeso: “Sei que, depois da minha partida, lobos ferozes penetrarão no meio de vocês e não pouparão o rebanho. E dentre vocês mesmos se levantarão homens que torcerão a verdade, a fim de atrair os discípulos” (At 20.29,30). O próprio Jesus advertiu: “Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm a vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por dentro são lobos devoradores. Vocês os reconhecerão por seus frutos” (Mt 7.15,16). Percebendo essa distinção entre a igreja invisível e a visível, Agostinho disse da igreja visível: “Muitas são as ovelhas do lado de fora, muitos os lobos do lado de dentro”.
Quando reconhecemos que há descrentes na igreja visível, há o perigo de nos tornarmos demasiadamente desconfiados e de começarmos a duvidar da salvação de muitos crentes verdadeiros. Calvino advertiu contra esse perigo dizendo que devemos fazer um “juízo de afeição” pelo qual reconhecemos como membros da igreja todos os que “pela confissão de fé, e pelo exemplo de vida, e pela participação dos sacramentos, conosco professam o mesmo Deus e Cristo”. Devemos tentar não excluir pessoas da comunhão da igreja até que elas por pecado público tragam disciplina sobre si mesmas. E óbvio, contudo, que a igreja não deveria tolerar em seu rol de membros “descrentes confessos” que, por profissão ou por vida, claramente se declaram fora da verdadeira igreja.



3. A igreja é local e universal. No NT a palavra igreja pode ser aplicada a um grupo de crentes em qualquer nível, desde a reunião de um grupo pequeno em uma casa particular até um grupo de verdadeiros crentes na igreja universal. A comunidade que se reunia nas casas é chamada “igreja” em Romanos 16.5 e lCoríntios 16.19 (“Áqüila e Priscila 1 [...] e também a igreja que se reúne na casa deles”). A igreja que se encontra em uma cidade também é chamada “igreja” (1 Co. 1.2; 2Co 1.1; lTs 1.l).A igreja de uma região é chamada ”igreja” em Atos 9.31:”A igreja passava. por um período de paz em toda a Judéia, Galiléia e Sarnaria”. Finalmente, a igreja por todo o mundo pode ser chamada “igreja”. Paulo diz: “Cristo amou a igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25), e disse ainda: “Na igreja, Deus estabeleceu primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; e em terceiro lugar, mestres...” (lCo 12.28). Neste versículo, a menção de “apóstolos”, que não foram dados à igreja individual, garante que a referência seja à igreja universal.
Podemos concluir que o grupo do povo de Deus considerado em qualquer nível desde a igreja local até a universal pode corretamente ser chamado “igreja”. Não devemos cometer o erro de dizer que somente a reunião de pessoas em casas expresse a verdadeira natureza da igreja, ou que somente igreja no nível de uma cidade possa ser corretamente chamada “igreja”,’ ou que somente a igreja universal possa ser corretamente chamada “igreja”. Ao contrário, a comunidade do povo de Deus considerada em qualquer nível pode corretamente ser chamada igreja.

4. Metáforas para a igreja. A fim de nos ajudar no entendimento da natureza da igreja, a Escritura usa uma variedade de imagens para nos descrever a que a igreja se assemelha. Há diversas imagens relacionadas com a família — por exemplo, Paulo vê a igreja como a família maior: “Não repreenda asperamente o homem idoso, mas exorte-o como se ele fosse seu pai; trate os jovens como a irmãos; as mulheres idosas, como a mães; e as moças, como a irmãs, com toda a pureza” (lTm 5.1,2). Deus é o nosso Pai celestial (Ef 3.14), e nós somos seus filhos e filhas, pois Deus nos diz: “Lhes serei Pai, e vocês serão meus filhos e minhas filhas, diz o Senhor todo-poderoso” (2Co 6.18). Somos, portanto, irmãos e irmãs uns dos outros na família de Deus (Mt 12.49,50; lJo 3.14-18). Uma metáfora de família um tanto diferente é vista quando Paulo se refere à igreja como a noiva de Cristo. Ele diz que o relacionamento entre marido e esposa refere-se “a Cristo e à igreja” (Ef 5.32); diz também que ele produziu o compromisso de noivado entre Cristo e a igreja em Corinto e que isso relembra compromisso entre a noiva e aquele que vai ser seu marido: “Eu os prometi a um único marido, Cristo, querendo apresentá-los a ele como uma virgem pura” (2Co 11.2) — aqui Paulo olha com expectativa para o tempo do retorno de Cristo como o tempo em que a igreja será apresentada a ele como sua noiva.
Em outras metáforas, a Escritura compara a igreja aos ramos de uma videira (Jo 15.5), a uma oliveira (Rm 11.17-24),a uma lavoura (lCo 3.6-9),a um edifício (lCo 3.9) e a uma colheita (Mt 13.1-30; lo 4.35). A igreja também é vista como um novo templo, não construído com pedras literais, mas construído com pessoas cristãs que são pedras vivas” (1 Pe 2.5), edificadas sobre a pedra fundamental” que é Cristo Jesus (lPe 2.4-8). Todavia, a igreja não é somente um novo templo para a adoração de Deus; é também um novo corpo de sacerdotes, um “sacerdócio santo” que pode oferecer”sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus”(lPe 2.5). Somos também vistos como casa de Deus (Hb 3.6), sendo o próprio Jesus Cristo visto como o “construtor” da casa (Hb 3.3). A igreja também é vista como “coluna e fundamento da verdade” (lTm 3.15).
Finalmente, outra metáfora familiar vê a igreja como o corpo de Cristo (lCo 12.12-27). Devemos reconhecer que Paulo de fato usa duas metáforas diferentes do corpo humano quando fala da igreja. Aqui em 1 Coríntios 12 o corpo inteiro é tomado como metáfora da igreja, porque Paulo fala do “ouvido”, do “olho” e do “olfato” (1 Co 12.16,17). Nessa metáfora, Cristo não é visto como a cabeça ligada ao corpo, porque os membros individuais são em si mesmos as partes individuais da cabeça. Cristo é nessa metáfora o Senhor que está “fora” desse corpo que representa a igreja e é a quem a igreja serve e adora.
Mas em Efésios 1.22,23; 4.15,16 e em Colossenses 2.19 Paulo usa uma metáfora diferente de corpo para referir-se à igreja. Nessas passagens, Paulo diz que Cristo é o cabeça e a igreja é como o restante do corpo, distinto da cabeça: “Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo. Dele todo o corpo, ajustado e unido pelo auxílio de todas as juntas, cresce edifica-se a si mesmo em amor, na medida em que cada parte realiza a sua função” (Ef 4.15,16). Não devemos confundir essas duas metáforas, a de lCoríntios 12 e a de Efésios 4, mas mantê-las distintas.
A ampla gama de metáforas usada para a igreja no NT deveria nos lembrar de não enfatizar exclusivamente uma delas. A ênfase indevida em uma metáfora com a exclusão de outras certamente resultará em uma perspectiva desequilibrada da igreja. Além disso, cada uma das metáforas usadas para a igreja pode nos ajudar a apreciar mais as riquezas do privilégio que Deus nos deu incorporando-nos na igreja. O fato de que a igreja é como uma família deveria aumentar o nosso amor e comunhão uns com os outros. O pensamento de que a igreja é igual à noiva de Cristo deveria estimular-nos a lutar pela pureza e santidade maiores e também ao amor e submissão maiores a Cristo. A imagem da igreja como ramos da videira deveria levar-nos ao descanso mais pleno em Cristo. Essas são apenas algumas das muitas aplicações que poderiam ser feitas da rica diversidade de metáforas para a igreja usada na Escritura.

A igreja e Israel. Entre os protestantes evangélicos há diferentes perspectivas sobre a questão do relacionamento entre Israel e a igreja. Uma perspectiva é a dispensacionalista. De acordo com ela, Deus tem dois planos distintos para dois grupos diferentes de pessoas que redimiu. Por um lado, os propósitos e as promessas para Israel são bênçãos terrenas, e serão cumpridas nesta terra em algum tempo no futuro. Por outro lado, os propósitos e as promessas para a igreja são bênçãos celestiais, e essas promessas serão cumpridas no céu. Essa distinção entre os dois grupos diferentes que Deus salva será vista especialmente no milênio, pois naquele tempo Israel reinará sobre a terra como o povo de Deus e desfrutará o cumprimento das promessas do AT, mas a igreja a essa altura já terá sido levada para o céu no tempo do retorno secreto de Cristo para os santos (“o arrebatamento”). Nessa perspectiva, a igreja não começou antes do Pentecoste (At 2), e não seria correto pensar nos crentes do AT junto com os crentes do NT constituindo uma igreja.
Diversos líderes entre os dispensacionalistas mais recentes têm modificado muitos desses pontos, referindo-se à sua estrutura teológica como “dispensacionalismo progressivo”. Eles não vêem a igreja como um parêntese no plano de Deus, mas como o primeiro passo em direção ao estabelecimento do Reino de Deus. Há assim um propósito único para Israel e a igreja — o estabelecimento do Reino de Deus — de que ambos, Israel e a igreja, compartilham. Além disso, o dispensacionalismo progressivo não veria distinção alguma entre Israel e a igreja no futuro estado eterno, pois todos serão parte do mesmo povo.
Contudo, há ainda uma diferença entre os dispensacionalistas progressivos e o restante dos evangélicos sobre um ponto: eles diriam que as profecias do AT concernentes a Israel ainda serão cumpridas no milênio pelo povo étnico judeu que crerá em Cristo e que viverá na terra de Israel como “nação-modelo” para a qual todas as nações olhariam e com a qual todas aprenderiam. Portanto, eles não diriam que a igreja é o “novo Israel” ou que todas as profecias do AT a respeito de Israel serão cumpridas na igreja, pois essas profecias ainda serão cumpridas no Israel étnico.
A posição assumida neste livro difere muito das posições dispensacionalistas tradicionais. Contudo, deve ser dito aqui que as questões a respeito do modo exato em que as profecias bíblicas a respeito do futuro serão cumpridas são por natureza difíceis de decidir com segurança, e é sábio ter algumas hesitações em nossas conclusões sobre o assunto. Com isso em mente, pode ser dito o que se segue.
Tanto teólogos protestantes como católicos que estão fora do círculo dispensacionalista têm dito que a igreja inclui tanto crentes do AT como do NT em uma igreja ou um corpo de Cristo. Devemos observar primeiro os muitos versículos do NT que entendem que a igreja seja o “novo Israel” ou o novo “povo de Deus”. O fato de que “Cristo amou a igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25) sugere isso. Ademais, esta era atual da igreja, que tem trazido a salvação a muitos milhões de cristãos, não é uma interrupção ou um parêntese nos planos de Deus, mas a continuação do seu plano expresso por todo o AT chamando pessoas para si. Paulo diz: “Não é judeu quem o é apenas exteriormente, nem é circuncisão a que é meramente exterior e física. Não! Judeu é quem o é interiormente, e circuncisão é a operada no coração, pelo Espírito, e não pela Lei escrita” (Rm 2.28,29). Paulo reconhece que, embora haja um sentido natural ou literal no qual os que descenderam fisicamente de Abraão são chamados judeus, há também um sentido mais profundo ou espiritual no qual o “judeu verdadeiro” é aquele que é interiormente um crente e cujo coração foi purificado por Deus.
Paulo diz que Abraão não deve somente ser considerado o pai do povo judeu em sentido físico. Ele é também no sentido mais profundo e mais verdadeiro “o pai de todos os que crêem, sem terem sido circuncidados [...] e é igualmente o pai dos circuncisos que não somente são circuncisos, mas também andam nos passos da fé que teve nosso pai Abraão antes de passar pela circuncisão” (Rm 4.11,12; cf. v. 16,18). Portanto, Paulo pode dizer: “Não pensemos que a palavra de Deus falhou. Pois nem todos os descendentes de Israel são Israel. Nem por serem descendentes de Abraão passaram todos a ser filhos de Abraão. Ao contrário: ‘Por meio de Isaque a sua descendência será considerada’. Isto é, não são os filhos naturais que são filhos de Deus, mas os filhos da promessa é que são considerados descendência de Abraão” (Rm 9.6-8). Paulo aqui sugere que os verdadeiros filhos de Abraão — “Israel” no sentido mais verdadeiro não é a nação de Israel por ascendência física de Abraão, mas os que creram em Cristo.
Longe de pensar na igreja como grupo separado do povo judeu, Paulo escreve aos crentes gentios de Éfeso dizendo-lhes que anteriormente eles estavam “sem Cristo, separados da comunidade de Israel, sendo estrangeiros quanto às alianças da promessa, sem esperança e sem Deus no mundo” (Ef2.12),mas que agora eles “foram aproximados mediante o sangue de Cristo” (Ef 2.13).E quando os gentios foram trazidos à igreja, judeus e gentios foram unidos em um só corpo. Paulo diz que Deus “destruiu a barreira, o muro de inimizade, anulando em seu corpo a Lei dos mandamentos expressa em ordenanças. O objetivo dele era criar em si mesmo, dos dois, um novo homem, fazendo a paz, e reconciliar com Deus os dois em um corpo, por meio da cruz, pela qual ele destruiu a inimizade” (Ef 2.14-16). Portanto, Paulo pode dizer que os gentios são “concidadãos dos santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, tendo Jesus Cristo como pedra angular”(Ef 2.19,20). Com essa consciência ampla do pano de fundo do AT para a igreja do NT, Paulo pode ainda dizer que “os gentios são co-herdeiros com Israel, membros do mesmo corpo, e co-participantes da promessa em Cristo Jesus” (Ef 3.6). A passagem toda fala fortemente da unidade de crentes judeus e gentios no corpo em Cristo e não dá indicação alguma de qualquer plano distintivo para a salvação do povo judeu independentemente do corpo de Cristo, a igreja. A igreja incorpora em si mesma todo o verdadeiro povo de Deus, e quase todos os títulos usados para o povo de Deus no AT são em um lugar ou outro aplicados à igreja do NT. Esses textos, juntamente com muitos outros, nos dão a segurança de que a igreja se tornou agora o verdadeiro Israel de Deus e vai receber todas as bênçãos prometidas a Israel no AT.

As “marcas” da igreja (características distintivas)

Há igrejas verdadeiras e igrejas falsas. O que realmente torna um grupo de pessoas uma igreja? O que é necessário para haver uma igreja? Será que um grupo de pessoas que alegam ser cristãs pode tornar-se tão diferente do que uma igreja deve ser que ele não mais possa ser chamado igreja?
Embora nos primeiros séculos da igreja cristã houvesse pouca controvérsia a respeito do que seria uma igreja verdadeira, com a Reforma uma questão crucial surgiu: Como podemos reconhecer uma igreja verdadeira? A Igreja Católica Romana é uma igreja verdadeira ou não? Para responder a essa pergunta, as pessoas tiveram de decidir quais eram as “marcas” de uma igreja verdadeira, as características distintas que nos levam a reconhecê-la como igreja verdadeira.
A Escritura certamente fala de igrejas falsas. Paulo fala dos templos pagãos em Corinto: “Quero dizer que o que os pagãos sacrificam é oferecido aos demônios e não a Deus” (lCo 10.20). Ele diz aos coríntios: “Vocês sabem que, quando eram pagãos, de uma forma ou de outra eram fortemente atraídos e levados para os ídolos mudos” (lCo 12.2).Esses templos pagãos eram certamente igrejas ou assembléias religiosas falsas. Ademais, a Escritura pode falar de uma assembléia religiosa que é realmente uma “sinagoga de Satanás” (Ap 2.9; 3.9). Aqui o Senhor ressuscitado parece estar se referindo a assembléias judaicas nas quais as pessoas alegavam ser israelitas, mas não eram verdadeiros israelitas que possuíam a fé salvadora. Suas assembléias religiosas não eram assembléias do povo de Cristo nessa época, mas dos que ainda pertenciam ao reino das trevas, o reino de Satanás. Isso certamente também seria uma igreja falsa.
Em grande medida, havia concordância entre Lutero e Calvino sobre essa questão da constituição da verdadeira igreja.A afirmação de fé luterana, chamada Confissão de Augsburgo (1530), definiu a igreja como “a congregação de todos os crentes, entre os quais o evangelho é pregado puramente e os santos sacramentos são administrados de acordo com o evangelho” (Art. VII). Semelhantemente, João Calvino disse: “Pois, onde quer que vemos a Palavra de Deus ser sinceramente pregada e ouvida, onde [vemos] serem os sacramentos administrados segundo a instituição de Cristo, aí, de modo nenhum se há de contestar, está uma igreja de Deus”. Ainda que haja ligeiras diferenças nessas confissões, o entendimento que eles tiveram das marcas distintivas de uma verdadeira igreja é muito semelhante. Em contraste com a visão de Lutero e de Calvino com respeito às marcas da igreja, a posição da Igreja Católica Romana tem sido que a igreja visível, que descendeu de Pedro e dos apóstolos, é a verdadeira igreja.
Parece apropriado considerar a visão de Lutero e Calvino sobre as marcas da verdadeira igreja como correta ainda hoje. A primeira marca que eles observaram foi a pregação correta da Palavra. Certamente, se a Palavra de Deus não está sendo pregada, mas simplesmente as falsas doutrinas ou as doutrinas humanas, então não há verdadeira igreja. Em alguns casos, podemos ter dificuldade em determinar exatamente quantas doutrinas errôneas podem ser toleradas antes de uma igreja deixar de ser considerada uma verdadeira igreja, mas há casos muito claros em que podemos dizer que uma igreja verdadeira não existe. Por exemplo, a Igreja de Jesus Cristo            dos Santos dos Últimos Dias (mórmon) não sustenta qualquer doutrina fundamental sobre a salvação, sobre a pessoa de Deus ou sobre a pessoa e obra de Jesus. Ela é claramente uma igreja falsa. Semelhantemente, as Testemunhas de Jeová ensinam a salvação pelas obras, não somente pela confiança em Cristo. Isso é um desvio de uma doutrina fundamental, porque, se as pessoas crêem nos ensinos desse grupo, elas simplesmente não serão salvas. Assim, as Testemunhas de Jeová também devem ser consideradas uma igreja falsa. Quando a pregação de uma igreja esconde de seus membros a mensagem do evangelho de salvação somente pela fé, de modo que a mensagem do evangelho não é claramente proclamada e não vem sendo proclamada há algum tempo, esse grupo específico não é realmente uma igreja.
A segunda marca da igreja, a administração correta dos sacramentos (batismo e ceia do Senhor), foi provavelmente afirmada em oposição ao ensino da Igreja Católica Romana de que a graça salvadora vem por meio dos sacramentos e, portanto, os sacramentos tornaram-se “obras” pelas quais nós temos mérito em nossa salvação. Desse modo, a Igreja Católica Romana estava insistindo no pagamento antes que no ensino da fé como o único meio de obter salvação, obscurecendo assim o evangelho. A necessidade de proteger a pureza do evangelho é uma razão para considerar o uso correto dos sacramentos (ou “ordenanças”, como são chamados pelos batistas) como a marca de uma verdadeira igreja.
Mas existe a segunda razão para incluir os sacramentos (ou ordenanças) como marca da igreja. Uma vez que uma organização comece a praticar o batismo e a ceia do Senhor, ela demonstra ser uma organização que continua essas práticas e está tentando funcionar como uma igreja. (Na sociedade moderna, uma organização que comece a se reunir aos domingos pela manhã para a adoração, a oração e para ensinar a Bíblia estará demonstrando claramente que está tentando funcionar como uma igreja.)
Uma terceira razão para incluir o uso correto dos sacramentos (ou ordenanças) é que o batismo e a ceia do Senhor servem como “controle do rol de membros” da igreja. O batismo é o meio de admissão de pessoas em uma igreja, e a ceia do Senhor é o meio de permitir que pessoas dêem um sinal de sua permanência no rol de membros da igreja — isso quer dizer que a igreja considera os que recebem o batismo e a ceia do Senhor como pessoas salvas. Portanto, essas atividades indicam o que uma igreja pensa a respeito da salvação, e elas são devidamente listadas como uma marca da igreja também hoje. Por contraste, os grupos que não administram o batismo e a ceia do Senhor indicam que não pretendem funcionar como uma igreja. Alguém pode permanecer em uma esquina com uma pequena multidão, e haver uma verdadeira pregação, com pessoas ouvindo a Palavra, mas o povo reunido não seria uma igreja. Mesmo um estudo bíblico feito num lar pode ter verdadeiro ensino e pessoas ouvindo a Palavra sem tornar-se uma igreja. Mas se um estudo bíblico em um local começa a batizar os recém-convertidos e eles passam regular-mente a participar da ceia do Senhor, tais atitudes demonstram a intenção de funcionar como uma igreja, portanto seria difícil não considerar esse grupo uma igreja em si mesma.

 Igrejas verdadeiras e falsas hoje. Em razão da questão colocada durante a Reforma, o que dizer a respeito da Igreja Católica Romana hoje? É uma igreja verdadeira? Aqui parece que não podemos simplesmente tomar uma decisão com respeito a ela como um todo porque está hoje muito diversificada. Algumas paróquias católicas certamente carecem de ambas as marcas —há pouca ou nenhuma pregação verdadeira da Palavra, e a mensagem de salvação do evangelho somente pela fé em Cristo não é conhecida ou recebida pelas pessoas. A participação nos sacramentos é vista como uma “obra” que pode alcançar mérito com Deus. Tal grupo de pessoas não é uma verdadeira igreja cristã. Em contrapartida, há atualmente muitas paróquias católicas em várias partes do mundo nas quais o sacerdote local tem conhecimento salvador genuíno de Cristo e um relacionamento vital e pessoal com Cristo em oração e estudo da Bíblia. Suas homilias e o ensino particular da Bíblia colocam muita ênfase na fé pessoal e na necessidade de leitura individual da Bíblia e de oração. Seu ensino sobre os sacramentos enfatiza os aspectos simbólicos e comemorativos em vez de tratá-los como atos que ocasionam a infusão da graça salvadora. Em tal caso, embora devamos dizer que ainda temos profundas diferenças com o ensino católico em relação a algumas doutrinas, entretanto parece que tal igreja se aproximaria a tal ponto das duas marcas da igreja que seria difícil negar que ela é de fato uma verdadeira igreja. Ela pareceria constituir uma genuína congregação de crentes na qual o evangelho é ensinado (embora não puramente) e os sacramentos são administrados mais correta que erroneamente.”
Há igrejas falsas dentro do protestantismo? Olhando para as duas marcas distintivas da igreja, parece-me que muitas igrejas protestantes liberais de hoje são de fato falsas igrejas. Será que o evangelho da justiça pelas obras e da incredulidade na Escritura que essas igrejas ensinam é muito diferente com respeito à salvação do ensino da Igreja Católica Romana no tempo da Reforma? E o que essas igrejas fazem, administrando os sacramentos sem o ensino da sã doutrina a qualquer pessoa que aparece, dando falsa segurança a pecadores não regenerados, não é semelhante ao que os católicos faziam com os sacramentos no tempo da Reforma? Quando há uma assembléia de pessoas que leva o nome cristã, mas que ensina firmemente que as pessoas não podem crer em sua, Bíblias — de fato, uma igreja cujo pastor e congregação raramente lêem suas Bíblias ou oram de modo significativo, e não crêem ou talvez nem mesmo entendam o evangelho da salvação somente pela fé em Cristo — como podemos dizer que essa é uma verdadeira igreja?

Os propósitos da igreja

Podemos entender os propósitos da igreja em termos de ministério para com Deus, com os crentes e com o mundo.

1.     Ministério para com Deus:

Adoração. Em relação a Deus, o propósito da igreja é adorá-lo. Paulo aconselha a igreja de Colossos:”Cantem salmos,hinos e cânticos espirituais com gratidão a Deus em seu coração” (Cl 3.16). Deus nos destinou em Cristo e nos separou “a fim de que nós sejamos para o louvor da sua glória” (Ef 1.12).A adoração na igreja não é meramente a preparação para algo mais; ela é em si mesma o cumprimento do maior propósito da igreja com referência ao seu Senhor. Essa é a razão pela qual Paulo exortou os efésios a aproveitar “ao máximo cada oportunidade”, associando isso com o mandamento para que se enchessem do Espírito e, então, falassem entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor” (Ef 5.16-19).

2.     Ministério para com os crentes:

Fortalecimento. Segundo a Escritura, a igreja tem a obrigação de fortalecer os que já são crentes e edificá-los para chegarem à maturidade da fé. Paulo disse que seu alvo não era simplesmente trazer pessoas à fé inicial, mas advertir e ensinar “a cada um com toda a sabedoria, para que apresentemos todo homem perfeito em Cristo” (Cl 1.28). E ele disse à igreja de Éfeso que Deus deu à igreja pessoas capacitadas “com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo” (Ef 4.12,13). É claramente contrário ao padrão do NT pensar que o nosso único objetivo com as pessoas é trazê-las à fé salvadora inicial. Nosso alvo como igreja deve ser apresentar perante Deus todo cristão “perfeito em Cristo” (CL 1.28).

3.     Ministério para com o mundo:

Evangelização e misericórdia. Jesus disse aos discípulos que eles deveriam fazer “discípulos de todas as nações” (Mt 28.19). Essa obra evangelística de declarar o evangelho é o ministério primário que a igreja tem para com o mundo. Todavia, um ministério de misericórdia deve vir acompanhando o ministério de evangelização, um ministério que inclua a preocupação com os pobres e necessitados, em nome do Senhor. Embora a ênfase do NT seja sobre dar ajuda material aos que são parte da igreja (At 11.29; 2Co 8.4; lJo 3.17), há ainda a afirmação de que é justo ajudar os descrentes mesmo que eles não respondam com gratidão ou que não aceitem a mensagem do evangelho. Jesus nos diz: “Amem, porém, os seus inimigos, façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então, a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque ele é bondoso para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, assim como o pai de vocês é misericordio” (Lc 6.35,36).

O argumento da explicação de Jesus é que devemos imitar Deus em ser amáveis para os que são ingratos e maus.
Além disso, temos o exemplo de Jesus, que não buscou curar somente os que o aceitaram como Messias. Antes, quando grandes multidões vieram a ele, “ele os curou, impondo as mãos sobre cada um deles” (Lc 4.40). Isso deveria dar-nos encorajamento para praticar ações amáveis e orar pela cura e por outras necessidades na vida dos descrentes assim como na dos crentes. Tais ministérios de misericórdia ao mundo podem também incluir a participação em atividades cívicas ou a tentativa de influenciar a política governamental para torná-la mais compatível com os princípios morais da Bíblia. Nas áreas onde há sistematicamente injustiça manifestada no tratamento aos pobres, a grupos étnicos ou ainda a minorias religiosas, a igreja deveria também orar e — à medida que tem a oportunidade — pregar contra a injustiça. Todos esses são caminhos pelos quais a igreja pode suplementar o seu ministério evangelístico ao mundo e, de fato, embelezar o evangelho que professa. Mas tais ministérios de misericórdia ao mundo nunca devem tornar-se um substituto da genuína evangelização ou de outras áreas do ministério para com Deus e para com os crentes mencionados anteriormente.

4.     Mantendo esses propósitos em equilíbrio:

Uma vez que mencionamos esses propósitos para a igreja, alguém poderia perguntar: “Qual é o mais importante?”. Ou outra pessoa perguntaria: “Poderíamos considerar um desses três menos importante que os outros?”.
Devemos responder que os três propósitos da igreja são ordenados por Deus na Escritura; portanto, todos são importantes e nenhum deles pode ser negligenciado. De fato, uma igreja forte terá ministérios eficazes nessas três áreas. Devemos nos precaver contra quaisquer tentativas de reduzir o propósito da igreja a somente um dos três e dizer que esse deveria ser o foco principal. De fato, tais tentativas de tornar um dos três propósitos mais importantes sempre resultarão em alguma negligência dos outros dois.
Contudo, diferentemente das igrejas, os indivíduos devem estabelecer uma prioridade em relação a um ou outro desses propósitos da igreja. Porque somos iguais a um corpo com diversos dons espirituais e capacidades, é correto colocarmos ênfase maior no cumprimento do propósito da igreja que está relacionado mais de perto com os dons e interesses que Deus nos deu. Quem tem o dom de evangelização deve naturalmente gastar algum tempo com a adoração e preocupação com os crentes, mas pode acabar gastando muito mais tempo na obra evangelística. Alguém que é líder capacitado em matéria de adoração pode dedicar 90% de seu tempo na igreja à preparação e à condução do culto. Essa é apenas uma resposta apropriada para a diversidade de dons que Deus nos deu.

Os propósitos da igreja

Podemos entender os propósitos da igreja em termos de ministério para com Deus, com os crentes e com o mundo.

1.     Ministério para com Deus:

Adoração. Em relação a Deus, o propósito da igreja é adorá-lo. Paulo aconselha a igreja de Colossos:”Cantem salmos,hinos e cânticos espirituais com gratidão a Deus em seu coração” (Cl 3.16). Deus nos destinou em Cristo e nos separou “a fim de que nós sejamos para o louvor da sua glória” (Ef 1.12).A adoração na igreja não é meramente a preparação para algo mais; ela é em si mesma o cumprimento do maior propósito da igreja com referência ao seu Senhor. Essa é a razão pela qual Paulo exortou os efésios a aproveitar “ao máximo cada oportunidade”, associando isso com o mandamento para que se enchessem do Espírito e, então, falassem entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor” (Ef 5.16-19).

2.     Ministério para com os crentes:

Fortalecimento. Segundo a Escritura, a igreja tem a obrigação de fortalecer os que já são crentes e edificá-los para chegarem à maturidade da fé. Paulo disse que seu alvo não era simplesmente trazer pessoas à fé inicial, mas advertir e ensinar “a cada um com toda a sabedoria, para que apresentemos todo homem perfeito em Cristo” (Cl 1.28). E ele disse à igreja de Éfeso que Deus deu à igreja pessoas capacitadas “com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo” (Ef 4.12,13). É claramente contrário ao padrão do NT pensar que o nosso único objetivo com as pessoas é trazê-las à fé salvadora inicial. Nosso alvo como igreja deve ser apresentar perante Deus todo cristão “perfeito em Cristo” (CL 1.28).

3.     Ministério para com o mundo:

Evangelização e misericórdia. Jesus disse aos discípulos que eles deveriam fazer “discípulos de todas as nações” (Mt 28.19). Essa obra evangelística de declarar o evangelho é o ministério primário que a igreja tem para com o mundo. Todavia, um ministério de misericórdia deve vir acompanhando o ministério de evangelização, um ministério que inclua a preocupação com os pobres e necessitados, em nome do Senhor. Embora a ênfase do NT seja sobre dar ajuda material aos que são parte da igreja (At 11.29; 2Co 8.4; lJo 3.17), há ainda a afirmação de que é justo ajudar os descrentes mesmo que eles não respondam com gratidão ou que não aceitem a mensagem do evangelho. Jesus nos diz: “Amem, porém, os seus inimigos, façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então, a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque ele é bondoso para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, assim como o pai de vocês é misericordio” (Lc 6.35,36).

O argumento da explicação de Jesus é que devemos imitar Deus em ser amáveis para os que são ingratos e maus.
Além disso, temos o exemplo de Jesus, que não buscou curar somente os que o aceitaram como Messias. Antes, quando grandes multidões vieram a ele, “ele os curou, impondo as mãos sobre cada um deles” (Lc 4.40). Isso deveria dar-nos encorajamento para praticar ações amáveis e orar pela cura e por outras necessidades na vida dos descrentes assim como na dos crentes. Tais ministérios de misericórdia ao mundo podem também incluir a participação em atividades cívicas ou a tentativa de influenciar a política governamental para torná-la mais compatível com os princípios morais da Bíblia. Nas áreas onde há sistematicamente injustiça manifestada no tratamento aos pobres, a grupos étnicos ou ainda a minorias religiosas, a igreja deveria também orar e — à medida que tem a oportunidade — pregar contra a injustiça. Todos esses são caminhos pelos quais a igreja pode suplementar o seu ministério evangelístico ao mundo e, de fato, embelezar o evangelho que professa. Mas tais ministérios de misericórdia ao mundo nunca devem tornar-se um substituto da genuína evangelização ou de outras áreas do ministério para com Deus e para com os crentes mencionados anteriormente.

4.     Mantendo esses propósitos em equilíbrio:

Uma vez que mencionamos esses propósitos para a igreja, alguém poderia perguntar: “Qual é o mais importante?”. Ou outra pessoa perguntaria: “Poderíamos considerar um desses três menos importante que os outros?”.
Devemos responder que os três propósitos da igreja são ordenados por Deus na Escritura; portanto, todos são importantes e nenhum deles pode ser negligenciado. De fato, uma igreja forte terá ministérios eficazes nessas três áreas. Devemos nos precaver contra quaisquer tentativas de reduzir o propósito da igreja a somente um dos três e dizer que esse deveria ser o foco principal. De fato, tais tentativas de tornar um dos três propósitos mais importantes sempre resultarão em alguma negligência dos outros dois.
Contudo, diferentemente das igrejas, os indivíduos devem estabelecer uma prioridade em relação a um ou outro desses propósitos da igreja. Porque somos iguais a um corpo com diversos dons espirituais e capacidades, é correto colocarmos ênfase maior no cumprimento do propósito da igreja que está relacionado mais de perto com os dons e interesses que Deus nos deu. Quem tem o dom de evangelização deve naturalmente gastar algum tempo com a adoração e preocupação com os crentes, mas pode acabar gastando muito mais tempo na obra evangelística. Alguém que é líder capacitado em matéria de adoração pode dedicar 90% de seu tempo na igreja à preparação e à condução do culto. Essa é apenas uma resposta apropriada para a diversidade de dons que Deus nos deu.


Teologia Sistemática.
Wayne Grudem.
Ed. Vida.


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