segunda-feira, 7 de outubro de 2013
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
A natureza da igreja
Como
reconhecer uma verdadeira igreja?
Quais
são os propósitos da igreja?
O
que torna uma igreja mais ou menos agradável a Deus?
EXPLICAÇÃO
E BASE BÍBLICA
A
natureza da igreja
A
Definição: A igreja é a comunidade de todos os verdadeiros crentes em todas as
épocas. Essa definição entende que a igreja seja composta de todos os que são
verdadeiramente salvos. Paulo diz que “Cristo amou a
igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25). Aqui a palavra “igreja”
aplica-se a todos aqueles por quem Cristo morreu a fim de redimi-los, todos os
que são salvos pela morte de Cristo. Mas ela deve incluir todos os verdadeiros
crentes de todas as épocas, tanto do período do NT como do período do AT. É tão
grande o plano de Deus para a igreja que ele exaltou Cristo a uma posição
elevada de autoridade por amor à sua igreja: “Deus colocou todas as coisas debaixo de seus pés e o
designou cabeça de todas as coisas para a igreja, que é o seu corpo, a
plenitude daquele que enche todas as coisas, em toda e qualquer circunstância”
(Ef 1.22,23).
O
próprio Jesus Cristo edifica sua igreja chamando para si o seu povo. Ele
prometeu: ”edificarei a minha igreja” (Mt 16.18). Mas esse processo pelo qual Cristo edifica a
igreja é apenas a continuação do padrão estabelecido por Deus no AT, quando ele
chamou pessoas para si mesmo para serem uma assembléia adoradora perante ele.
Há diversas indicações no AT de que Deus viu seu povo como “igreja”, o povo
reunido com o propósito de adorá-lo. Quando Moises diz ao povo que o Senhor lhe
havia dito: “Reúna o povo diante de mim para ouvir as
minhas palavras, a fim de que aprendam a me temer enquanto viverem sobre a
terra, e as ensinem a seu filhos” (Dt 4.10), a LXX traduz a palavra “reunir”
(heb. q ¯ ahal) usando o termo grego ekkl¯ esiaz ¯o, que significa “convocar uma assembléia”, um verbo que é cognato
do substantivo grego do NT ekkl¯ esia, “igreja”
Não
é de surpreender que os autores do NT falem do povo de Israel do AT como
“igreja” (ekklēsia). Por exemplo, Estêvão
fala do povo de Israel no deserto como “a igreja
(ekklēsia) no desertor (At 7.38, tradução do autor). Da mesma forma o
autor de Hebreus cita Cristo referindo-se a ele como quem haveria de louvar a
Deus no meio da grande assembléia do povo de Deus no céu: “Proclamarei o teu nome a meus irmãos; na igreja (ekklēsia)
te louvarei” (Hb 2.12, tradução do autor; o escritor de Hebreus está
citando SL 22.22).
Portanto,
o autor de Hebreus entende que os cristãos do tempo presente que constituem a
igreja sobre a terra estão cercados por uma grande ”nuvem
de testemunhas” (Hb 12.1) que abrange retroativamente as épocas do AT,
incluindo Abel, Enoque, Noé, Abraão, Sara, Gideão, Baraque, Sansão, Jefté,
Davi, Samuel e os profetas (Hb 11.4-32). Todas essas “testemunhas” rodeiam o
povo de Deus do tempo presente, e parece apropriado pensar que elas, juntamente
com o povo de Deus do NT, sejam a grande “assembléia” espiritual de Deus, ou
seja, a “igreja” Portanto, muito embora
haja certamente novos privilégios e novas bênçãos conferidas ao povo de Deus no
NT, ambos os usos do termo igreja na Escritura e o fato de que por meio de toda
a Escritura Deus sempre chamou seu povo para reunir-se para a adoração do seu
nome indicam que é correto entender que a igreja é constituída de todo o povo
de Deus de todas as épocas, tanto dos crentes do AT como do NT.
2. A igreja é
invisível, todavia visível.
Em sua verdadeira realidade espiritual como a comunhão de todos os crentes
genuínos, a igreja é invisível. Isso porque não podemos ver a condição
espiritual do coração das pessoas. Podemos ver exteriormente os que freqüentam
a igreja e observar evidências exteriores de mudanças espirituais interiores,
mas realmente não podemos olhar para o coração das pessoas e ver o estado
espiritual delas — somente Deus pode fazer isso. É por isso que Paulo diz: “O Senhor conhece
quem lhe pertence” (2Tm 2.19). Em
nossas igrejas e em nossa vizinhança, somente Deus sabe com certeza (sem margem
de erro) quem são os verdadeiramente crentes. Falando da igreja como invisível,
o autor de Hebreus refere-se “à igreja dos primogênitos, cujos nomes estão escritos nos céus” (Hb
12.23) e diz que os cristãos do tempo presente se juntam a essa
assembléia em adoração.
Podemos
dar a seguinte definição: A igreja invisível é a igreja como Deus a vê. Tanto
Martinho Lutero como João Calvino foram enfáticos em afirmar esse aspecto
invisível da igreja contra o ensino de que a Igreja Católica Romana era a única
organização visível que descendia dos apóstolos em linhagem ininterrupta de
sucessão (por meio dos bispos da igreja). A Igreja Católica Romana argumentava
que somente em sua organização visível poderíamos encontrar a verdadeira
igreja, a única igreja verdadeira. Mesmo hoje tal pensamento é sustentado pela
Igreja Católica Romana. Tanto Lutero como Calvino discordaram dessa idéia,
asseverando que a Igreja Católica Romana possuía uma forma exterior, uma
organização, mas que isso era apenas uma casca. Calvino argumentou que
exatamente como Caifás (o sumo sacerdote do tempo de Jesus) descendia de Arão,
mas não era um verdadeiro sacerdote, assim os bispos católicos romanos
“descendiam” dos apóstolos segundo a linhagem de sucessão, mas não eram
verdadeiros bispos da igreja de Cristo, pois haviam se desviado da verdadeira
pregação do evangelho. Logo, sua organização visível não era a verdadeira
igreja.
A
verdadeira igreja de Cristo, no entanto, certamente também possui um aspecto
visível. Podemos usar a seguinte definição: A igreja visível é a igreja como os
cristãos a vêem. Nesse sentido, a igreja visível inclui todos os que professam
a fé em Cristo e dão evidência dessa fé em sua vida.
Nessa
definição, não estamos dizendo que a igreja visível é a igreja que qualquer
pessoa no mundo (como um descrente ou alguém que sustenta ensinos heréticos)
pode ver, mas estamos falando da igreja como ela é percebida por aqueles que
são crentes genuínos e que têm um entendimento da diferença entre crentes e
descrentes.
A
igreja visível espalhada por todo o mundo sempre incluirá alguns descrentes, e
as congregações individuais normalmente incluirão alguns descrentes, porque não
podemos ver o coração como Deus vê. Paulo fala de Himeneu e Fileto: “O ensino deles
alastra-se como câncer [...] Estes se desviaram da verdade li.] a alguns pervertem
a fé” (2Tm 2.17,18). Mas ele está confiante de que “o Senhor conhece quem lhe pertence” (2Tm
2.19). Semelhantemente, Paulo adverte os presbíteros de Éfeso: “Sei que, depois
da minha partida, lobos ferozes penetrarão no meio de vocês e não pouparão o
rebanho. E dentre vocês mesmos se levantarão homens que torcerão a verdade, a
fim de atrair os discípulos” (At 20.29,30). O próprio Jesus
advertiu: “Cuidado
com os falsos profetas. Eles vêm a vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por
dentro são lobos devoradores. Vocês os reconhecerão por seus frutos” (Mt
7.15,16). Percebendo essa distinção entre a igreja invisível e a
visível, Agostinho disse da igreja visível: “Muitas são as ovelhas do lado de
fora, muitos os lobos do lado de dentro”.
Quando
reconhecemos que há descrentes na igreja visível, há o perigo de nos tornarmos
demasiadamente desconfiados e de começarmos a duvidar da salvação de muitos
crentes verdadeiros. Calvino advertiu contra esse perigo dizendo
que devemos fazer um “juízo de afeição” pelo qual reconhecemos como membros da
igreja todos os que “pela confissão de fé, e pelo exemplo de vida, e pela
participação dos sacramentos, conosco professam o mesmo Deus e Cristo”.
Devemos tentar não excluir pessoas da comunhão da igreja até que elas por pecado
público tragam disciplina sobre si mesmas. E óbvio, contudo, que a igreja não
deveria tolerar em seu rol de membros “descrentes confessos” que, por profissão
ou por vida, claramente se declaram fora da verdadeira igreja.
3. A igreja é
local e universal.
No NT a palavra igreja pode ser aplicada a um grupo de crentes em qualquer
nível, desde a reunião de um grupo pequeno em uma casa particular até um grupo
de verdadeiros crentes na igreja universal. A comunidade que se reunia nas
casas é chamada “igreja” em Romanos
16.5 e lCoríntios 16.19 (“Áqüila e Priscila 1 [...] e
também a igreja que se reúne na casa deles”). A igreja que se encontra
em uma cidade também é chamada “igreja” (1 Co. 1.2; 2Co 1.1; lTs 1.l).A igreja
de uma região é chamada ”igreja” em Atos
9.31:”A igreja passava. por um período de paz em toda a Judéia, Galiléia e
Sarnaria”. Finalmente, a igreja por todo o mundo pode ser chamada “igreja”.
Paulo diz: “Cristo amou a igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25), e disse
ainda: “Na igreja, Deus estabeleceu
primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; e em terceiro lugar,
mestres...” (lCo 12.28). Neste versículo, a menção de “apóstolos”, que não
foram dados à igreja individual, garante que a referência seja à igreja
universal.
Podemos
concluir que o grupo do povo de Deus considerado em qualquer nível desde a
igreja local até a universal pode corretamente ser chamado “igreja”. Não
devemos cometer o erro de dizer que somente a reunião de pessoas em casas
expresse a verdadeira natureza da igreja, ou que somente igreja no nível de uma
cidade possa ser corretamente chamada “igreja”,’ ou que somente a igreja
universal possa ser corretamente chamada “igreja”. Ao contrário, a comunidade
do povo de Deus considerada em qualquer nível pode corretamente ser chamada
igreja.
4. Metáforas para a igreja. A fim de nos
ajudar no entendimento da natureza da igreja, a Escritura usa uma variedade de
imagens para nos descrever a que a igreja se assemelha. Há diversas imagens
relacionadas com a família — por exemplo, Paulo vê a igreja como a família
maior: “Não repreenda asperamente o
homem idoso, mas exorte-o como se ele fosse seu pai; trate os jovens como a
irmãos; as mulheres idosas, como a mães; e as moças, como a irmãs, com toda a
pureza” (lTm 5.1,2). Deus é o nosso Pai celestial (Ef 3.14), e nós somos
seus filhos e filhas, pois Deus nos diz:
“Lhes serei Pai, e vocês serão meus filhos e minhas filhas, diz o Senhor
todo-poderoso” (2Co 6.18). Somos, portanto, irmãos e irmãs uns dos outros
na família de Deus (Mt 12.49,50; lJo 3.14-18). Uma metáfora de família um tanto
diferente é vista quando Paulo se refere à igreja como a noiva de Cristo. Ele
diz que o relacionamento entre marido e esposa refere-se “a Cristo e à igreja” (Ef 5.32); diz também que ele produziu o compromisso
de noivado entre Cristo e a igreja em Corinto e que isso relembra compromisso
entre a noiva e aquele que vai ser seu marido: “Eu os prometi a um único marido, Cristo, querendo apresentá-los a
ele como uma virgem pura” (2Co 11.2)
— aqui Paulo olha com expectativa para o tempo do retorno de Cristo como o
tempo em que a igreja será apresentada a ele como sua noiva.
Em
outras metáforas, a Escritura compara a igreja aos ramos de uma videira (Jo
15.5), a uma oliveira (Rm 11.17-24),a uma lavoura (lCo 3.6-9),a um edifício
(lCo 3.9) e a uma colheita (Mt 13.1-30; lo 4.35). A igreja também é vista como
um novo templo, não
construído com pedras literais, mas construído com pessoas cristãs que são
pedras vivas” (1 Pe 2.5),
edificadas sobre a pedra fundamental” que é Cristo Jesus (lPe 2.4-8). Todavia,
a igreja não é somente um novo templo para a adoração de Deus; é também um novo
corpo de sacerdotes, um “sacerdócio santo” que pode oferecer”sacrifícios
espirituais aceitáveis a Deus”(lPe 2.5). Somos também vistos como casa de Deus
(Hb 3.6), sendo o próprio Jesus Cristo visto como o “construtor” da casa (Hb
3.3). A igreja também é vista como “coluna e fundamento da verdade” (lTm 3.15).
Finalmente,
outra metáfora familiar vê a igreja como o corpo de Cristo (lCo 12.12-27).
Devemos reconhecer que Paulo de fato usa duas metáforas diferentes do corpo
humano quando fala da igreja. Aqui em 1 Coríntios 12 o corpo inteiro é tomado como
metáfora da igreja, porque Paulo fala do “ouvido”, do “olho” e do “olfato” (1
Co 12.16,17). Nessa metáfora, Cristo não é visto como a cabeça ligada ao corpo,
porque os membros individuais são em si mesmos as partes individuais da cabeça.
Cristo é nessa metáfora o Senhor que está “fora” desse corpo que representa a
igreja e é a quem a igreja serve e adora.
Mas
em Efésios 1.22,23; 4.15,16 e em Colossenses 2.19 Paulo usa uma metáfora
diferente de corpo para referir-se à igreja. Nessas passagens, Paulo diz que
Cristo é o cabeça e a igreja é como o restante do corpo, distinto da cabeça:
“Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça,
Cristo. Dele todo o corpo, ajustado e unido pelo auxílio de todas as juntas,
cresce edifica-se a si mesmo em amor, na medida em que cada parte realiza a sua
função” (Ef 4.15,16). Não devemos confundir essas duas metáforas, a de
lCoríntios 12 e a de Efésios 4, mas mantê-las distintas.
A ampla gama de
metáforas usada para a igreja no NT deveria nos lembrar de não enfatizar
exclusivamente uma delas. A ênfase indevida em uma metáfora com a exclusão de
outras certamente resultará em uma perspectiva desequilibrada da igreja. Além disso, cada uma das
metáforas usadas para a igreja pode nos ajudar a apreciar mais as riquezas do
privilégio que Deus nos deu incorporando-nos na igreja. O fato de que a igreja
é como uma família deveria aumentar o nosso amor e comunhão uns com os outros.
O pensamento de que a igreja é igual à noiva de Cristo deveria estimular-nos a
lutar pela pureza e santidade maiores e também ao amor e submissão maiores a
Cristo. A imagem da igreja como ramos da videira deveria levar-nos ao descanso
mais pleno em Cristo. Essas são apenas algumas das muitas aplicações que
poderiam ser feitas da rica diversidade de metáforas para a igreja usada na
Escritura.
A igreja e Israel. Entre os protestantes
evangélicos há diferentes perspectivas sobre a questão do relacionamento entre
Israel e a igreja. Uma perspectiva é a dispensacionalista.
De acordo com ela, Deus tem dois planos distintos para dois grupos diferentes
de pessoas que redimiu. Por um lado, os propósitos e as promessas para Israel
são bênçãos terrenas, e serão cumpridas nesta terra em algum tempo no futuro.
Por outro lado, os propósitos e as promessas para a igreja são bênçãos
celestiais, e essas promessas serão cumpridas no céu. Essa distinção entre os
dois grupos diferentes que Deus salva será vista especialmente no milênio, pois
naquele tempo Israel reinará sobre a terra como o povo de Deus e desfrutará o
cumprimento das promessas do AT, mas a igreja a essa altura já terá sido levada
para o céu no tempo do retorno secreto de Cristo para os santos (“o arrebatamento”). Nessa perspectiva,
a igreja não começou antes do Pentecoste (At 2), e não seria correto pensar nos
crentes do AT junto com os crentes do NT constituindo uma igreja.
Diversos
líderes entre os dispensacionalistas mais recentes têm modificado muitos desses
pontos, referindo-se à sua estrutura teológica como “dispensacionalismo
progressivo”. Eles não vêem a igreja como um parêntese no plano de Deus, mas
como o primeiro passo em direção ao estabelecimento do Reino de Deus. Há assim
um propósito único para Israel e a igreja — o estabelecimento do Reino de Deus
— de que ambos, Israel e a igreja, compartilham. Além disso, o
dispensacionalismo progressivo não veria distinção alguma entre Israel e a
igreja no futuro estado eterno, pois todos serão parte do mesmo povo.
Contudo,
há ainda uma diferença entre os dispensacionalistas progressivos e o restante
dos evangélicos sobre um ponto: eles diriam que as profecias do AT concernentes
a Israel ainda serão cumpridas no milênio pelo povo étnico judeu que crerá em
Cristo e que viverá na terra de Israel como “nação-modelo” para a qual todas as nações olhariam e com a qual
todas aprenderiam. Portanto, eles não diriam que a igreja é o “novo Israel” ou que todas as profecias
do AT a respeito de Israel serão cumpridas na igreja, pois essas profecias
ainda serão cumpridas no Israel étnico.
A
posição assumida neste livro difere muito das posições dispensacionalistas
tradicionais. Contudo, deve ser dito aqui que as questões a respeito do modo
exato em que as profecias bíblicas a respeito do futuro serão cumpridas são por
natureza difíceis de decidir com segurança, e é sábio ter algumas hesitações em
nossas conclusões sobre o assunto. Com isso em mente, pode ser dito o que se
segue.
Tanto
teólogos protestantes como católicos que estão fora do círculo
dispensacionalista têm dito que a igreja inclui tanto crentes do AT como do NT
em uma igreja ou um corpo de Cristo. Devemos observar primeiro os muitos
versículos do NT que entendem que a igreja seja o “novo Israel” ou o novo “povo
de Deus”. O fato de que “Cristo amou a igreja e entregou-se por ela” (Ef 5.25)
sugere isso. Ademais, esta era atual da igreja, que tem trazido a salvação a
muitos milhões de cristãos, não é uma interrupção ou um parêntese nos planos de
Deus, mas a continuação do seu plano expresso por todo o AT chamando pessoas
para si. Paulo diz: “Não é judeu quem o é apenas exteriormente, nem é circuncisão
a que é meramente exterior e física. Não! Judeu é quem o é interiormente, e
circuncisão é a operada no coração, pelo Espírito, e não pela Lei escrita” (Rm
2.28,29). Paulo reconhece que, embora haja um sentido natural ou
literal no qual os que descenderam fisicamente de Abraão são chamados judeus,
há também um sentido mais profundo ou espiritual no qual o “judeu verdadeiro” é aquele que é interiormente um crente e cujo
coração foi purificado por Deus.
Paulo
diz que Abraão não deve somente ser considerado o pai do povo judeu em sentido
físico. Ele é também no sentido mais profundo e mais verdadeiro “o pai de todos os
que crêem, sem terem sido circuncidados [...] e é igualmente o pai dos
circuncisos que não somente são circuncisos, mas também andam nos passos da fé
que teve nosso pai Abraão antes de passar pela circuncisão” (Rm 4.11,12; cf. v.
16,18). Portanto, Paulo pode dizer: “Não pensemos que a palavra de Deus falhou.
Pois nem todos os descendentes de Israel são Israel. Nem por serem descendentes
de Abraão passaram todos a ser filhos de Abraão. Ao contrário: ‘Por meio de Isaque a sua descendência será considerada’. Isto é, não são os filhos naturais que são filhos de Deus,
mas os filhos da promessa é que são considerados descendência de Abraão” (Rm
9.6-8). Paulo aqui sugere que os verdadeiros filhos de Abraão — “Israel” no sentido mais verdadeiro não é a nação de
Israel por ascendência física de Abraão, mas os que creram em Cristo.
Longe
de pensar na igreja como grupo separado do povo judeu, Paulo escreve aos
crentes gentios de Éfeso dizendo-lhes que anteriormente eles estavam “sem Cristo,
separados da comunidade de Israel, sendo estrangeiros quanto às alianças da
promessa, sem esperança e sem Deus no mundo” (Ef2.12),mas que agora
eles “foram
aproximados mediante o sangue de Cristo” (Ef 2.13).E quando os gentios
foram trazidos à igreja, judeus e gentios foram unidos em um só corpo. Paulo
diz que Deus “destruiu
a barreira, o muro de inimizade, anulando em seu corpo a Lei dos mandamentos
expressa em ordenanças. O objetivo dele era criar em si mesmo, dos dois, um
novo homem, fazendo a paz, e reconciliar com Deus os dois em um corpo, por meio
da cruz, pela qual ele destruiu a inimizade” (Ef 2.14-16). Portanto,
Paulo pode dizer que os gentios são “concidadãos dos santos e membros da família de Deus,
edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, tendo Jesus Cristo
como pedra angular”(Ef 2.19,20). Com essa consciência ampla do pano
de fundo do AT para a igreja do NT, Paulo pode ainda dizer que “os gentios são
co-herdeiros com Israel, membros do mesmo corpo, e co-participantes da promessa
em Cristo Jesus” (Ef 3.6). A passagem toda fala fortemente da unidade de crentes
judeus e gentios no corpo em Cristo e não dá indicação alguma de qualquer plano
distintivo para a salvação do povo judeu independentemente do corpo de Cristo,
a igreja. A igreja incorpora em si mesma todo o verdadeiro povo de
Deus, e quase todos os títulos usados para o povo de Deus no AT são em um lugar
ou outro aplicados à igreja do NT. Esses textos, juntamente com muitos outros,
nos dão a segurança de que a igreja se tornou agora o verdadeiro Israel de Deus
e vai receber todas as bênçãos prometidas a Israel no AT.
As
“marcas” da igreja (características distintivas)
Há igrejas
verdadeiras e igrejas falsas.
O que realmente torna um grupo de
pessoas uma igreja? O que é
necessário para haver uma igreja? Será que um grupo de pessoas que alegam ser
cristãs pode tornar-se tão diferente do que uma igreja deve ser que ele não
mais possa ser chamado igreja?
Embora
nos primeiros séculos da igreja cristã houvesse pouca controvérsia a respeito
do que seria uma igreja verdadeira, com a Reforma uma questão crucial surgiu:
Como podemos reconhecer uma igreja verdadeira? A Igreja Católica Romana é uma
igreja verdadeira ou não? Para responder a essa pergunta, as pessoas tiveram de
decidir quais eram as “marcas” de uma igreja verdadeira, as características
distintas que nos levam a reconhecê-la como igreja verdadeira.
A
Escritura certamente fala de igrejas falsas. Paulo fala dos templos pagãos em
Corinto: “Quero
dizer que o que os pagãos sacrificam é oferecido aos demônios e não a Deus”
(lCo 10.20). Ele diz aos coríntios: “Vocês
sabem que, quando eram pagãos, de uma forma ou de outra eram fortemente
atraídos e levados para os ídolos mudos” (lCo 12.2).Esses templos pagãos
eram certamente igrejas ou assembléias religiosas falsas. Ademais, a Escritura
pode falar de uma assembléia religiosa que é realmente uma “sinagoga de Satanás” (Ap 2.9; 3.9). Aqui o Senhor
ressuscitado parece estar se referindo a assembléias judaicas nas quais as
pessoas alegavam ser israelitas, mas não eram verdadeiros israelitas que
possuíam a fé salvadora. Suas assembléias religiosas não eram assembléias do
povo de Cristo nessa época, mas dos que ainda pertenciam ao reino das trevas, o
reino de Satanás. Isso certamente também seria uma igreja falsa.
Em
grande medida, havia concordância entre Lutero e Calvino sobre essa questão da
constituição da verdadeira igreja.A afirmação de fé luterana, chamada Confissão
de Augsburgo (1530), definiu a igreja como “a congregação de todos os crentes, entre os quais o
evangelho é pregado puramente e os santos sacramentos são administrados de
acordo com o evangelho” (Art. VII). Semelhantemente, João Calvino
disse: “Pois,
onde quer que vemos a Palavra de Deus ser sinceramente pregada e ouvida, onde
[vemos] serem os sacramentos administrados segundo a instituição de Cristo, aí,
de modo nenhum se há de contestar, está uma igreja de Deus”. Ainda
que haja ligeiras diferenças nessas confissões, o entendimento que eles tiveram
das marcas distintivas de uma verdadeira igreja é muito semelhante. Em
contraste com a visão de Lutero e de Calvino com respeito às marcas da igreja,
a posição da Igreja Católica Romana tem sido que a igreja visível, que
descendeu de Pedro e dos apóstolos, é a verdadeira igreja.
Parece
apropriado considerar a visão de Lutero e Calvino sobre as marcas da verdadeira
igreja como correta ainda hoje. A primeira marca que eles observaram foi a
pregação correta da Palavra. Certamente, se a Palavra de Deus não está sendo
pregada, mas simplesmente as falsas doutrinas ou as doutrinas humanas, então
não há verdadeira igreja. Em alguns casos, podemos ter dificuldade em
determinar exatamente quantas doutrinas errôneas podem ser toleradas antes de
uma igreja deixar de ser considerada uma verdadeira igreja, mas há casos muito
claros em que podemos dizer que uma igreja verdadeira não existe. Por exemplo,
a Igreja de Jesus Cristo dos
Santos dos Últimos Dias (mórmon) não sustenta qualquer doutrina
fundamental sobre a salvação, sobre a pessoa de Deus ou sobre a pessoa e obra
de Jesus. Ela é claramente uma igreja falsa. Semelhantemente, as Testemunhas de
Jeová ensinam a salvação pelas obras, não somente pela confiança em
Cristo. Isso é um desvio de uma doutrina fundamental, porque, se as pessoas
crêem nos ensinos desse grupo, elas simplesmente não serão salvas. Assim, as
Testemunhas de Jeová também devem ser consideradas uma igreja falsa. Quando a
pregação de uma igreja esconde de seus membros a mensagem do evangelho de salvação
somente pela fé, de modo que a mensagem do evangelho não é claramente
proclamada e não vem sendo proclamada há algum tempo, esse grupo específico não
é realmente uma igreja.
A segunda marca
da igreja, a
administração correta dos sacramentos (batismo e ceia do Senhor), foi provavelmente
afirmada em oposição ao ensino da Igreja Católica Romana de que a graça
salvadora vem por meio dos sacramentos e, portanto, os sacramentos tornaram-se “obras” pelas
quais nós temos mérito em nossa salvação. Desse modo, a Igreja Católica Romana
estava insistindo no pagamento antes que no ensino da fé como o único meio de
obter salvação, obscurecendo assim o evangelho. A necessidade de proteger a
pureza do evangelho é uma razão para considerar o uso correto dos sacramentos
(ou “ordenanças”, como são chamados pelos batistas) como a marca de uma
verdadeira igreja.
Mas
existe a segunda razão para incluir os sacramentos (ou ordenanças) como marca
da igreja. Uma vez que uma organização comece a praticar o batismo e a ceia do
Senhor, ela demonstra ser uma organização que continua essas práticas e está
tentando funcionar como uma igreja. (Na sociedade moderna, uma organização que
comece a se reunir aos domingos pela manhã para a adoração, a oração e para
ensinar a Bíblia estará demonstrando claramente que está tentando funcionar
como uma igreja.)
Uma
terceira razão para incluir o uso correto dos sacramentos (ou ordenanças) é que
o batismo e a ceia do Senhor servem como “controle
do rol de membros” da igreja. O batismo é o meio de admissão de pessoas em
uma igreja, e a ceia do Senhor é o meio de permitir que pessoas dêem um sinal
de sua permanência no rol de membros da igreja — isso quer dizer que a igreja
considera os que recebem o batismo e a ceia do Senhor como pessoas salvas. Portanto,
essas atividades indicam o que uma igreja pensa a respeito da salvação, e elas
são devidamente listadas como uma marca da igreja também hoje. Por contraste,
os grupos que não administram o batismo e a ceia do Senhor indicam que não
pretendem funcionar como uma igreja. Alguém pode permanecer em uma esquina com
uma pequena multidão, e haver uma verdadeira pregação, com pessoas ouvindo a
Palavra, mas o povo reunido não seria uma igreja. Mesmo um estudo bíblico feito
num lar pode ter verdadeiro ensino e pessoas ouvindo a Palavra sem tornar-se
uma igreja. Mas se um estudo bíblico em um local começa a batizar os
recém-convertidos e eles passam regular-mente a participar da ceia do Senhor,
tais atitudes demonstram a intenção de funcionar como uma igreja, portanto
seria difícil não considerar esse grupo uma igreja em si mesma.
Igrejas verdadeiras e falsas hoje. Em razão da questão colocada
durante a Reforma, o que dizer a respeito da Igreja Católica Romana hoje? É uma
igreja verdadeira? Aqui parece que não podemos simplesmente tomar uma decisão
com respeito a ela como um todo porque está hoje muito diversificada. Algumas
paróquias católicas certamente carecem de ambas as marcas —há pouca ou nenhuma
pregação verdadeira da Palavra, e a mensagem de salvação do evangelho somente
pela fé em Cristo não é conhecida ou recebida pelas pessoas. A participação nos
sacramentos é vista como uma “obra” que pode alcançar mérito com Deus. Tal grupo
de pessoas não é uma verdadeira igreja cristã. Em contrapartida, há atualmente
muitas paróquias católicas em várias partes do mundo nas quais o sacerdote
local tem conhecimento salvador genuíno de Cristo e um relacionamento vital e
pessoal com Cristo em oração e estudo da Bíblia. Suas homilias e o ensino
particular da Bíblia colocam muita ênfase na fé pessoal e na necessidade de
leitura individual da Bíblia e de oração. Seu ensino sobre os sacramentos
enfatiza os aspectos simbólicos e comemorativos em vez de tratá-los como atos
que ocasionam a infusão da graça salvadora. Em tal caso, embora devamos dizer
que ainda temos profundas diferenças com o ensino católico em relação a algumas
doutrinas, entretanto parece que tal igreja se aproximaria a tal ponto das duas
marcas da igreja que seria difícil negar que ela é de fato uma verdadeira
igreja. Ela pareceria constituir uma genuína congregação de crentes na qual o
evangelho é ensinado (embora não puramente) e os sacramentos são administrados
mais correta que erroneamente.”
Há
igrejas falsas dentro do protestantismo? Olhando para as duas marcas
distintivas da igreja, parece-me que muitas igrejas protestantes liberais de
hoje são de fato falsas igrejas. Será que o evangelho da justiça pelas obras e
da incredulidade na Escritura que essas igrejas ensinam é muito diferente com
respeito à salvação do ensino da Igreja Católica Romana no tempo da Reforma? E
o que essas igrejas fazem, administrando os sacramentos sem o ensino da sã
doutrina a qualquer pessoa que aparece, dando falsa segurança a pecadores não
regenerados, não é semelhante ao que os católicos faziam com os sacramentos no
tempo da Reforma? Quando há uma assembléia de pessoas que leva o nome cristã,
mas que ensina firmemente que as pessoas não podem crer em sua, Bíblias — de
fato, uma igreja cujo pastor e congregação raramente lêem suas Bíblias ou oram
de modo significativo, e não crêem ou talvez nem mesmo entendam o evangelho da
salvação somente pela fé em Cristo — como podemos dizer que essa é uma
verdadeira igreja?
Os
propósitos da igreja
Podemos
entender os propósitos da igreja em termos de ministério para com Deus, com os
crentes e com o mundo.
1. Ministério para com Deus:
Adoração.
Em relação a Deus, o propósito da igreja é adorá-lo. Paulo aconselha a igreja
de Colossos:”Cantem salmos,hinos e cânticos espirituais com gratidão a Deus em
seu coração” (Cl 3.16). Deus nos destinou em Cristo e nos separou “a fim de que
nós sejamos para o louvor da sua glória” (Ef 1.12).A adoração na igreja não é
meramente a preparação para algo mais; ela é em si mesma o cumprimento do maior
propósito da igreja com referência ao seu Senhor. Essa é a razão pela qual
Paulo exortou os efésios a aproveitar “ao máximo cada oportunidade”, associando
isso com o mandamento para que se enchessem do Espírito e, então, falassem
entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de
coração ao Senhor” (Ef 5.16-19).
2. Ministério para com os crentes:
Fortalecimento.
Segundo a Escritura, a igreja tem a obrigação de fortalecer os que já são
crentes e edificá-los para chegarem à maturidade da fé. Paulo disse que seu
alvo não era simplesmente trazer pessoas à fé inicial, mas advertir e ensinar
“a cada um com toda a sabedoria, para que apresentemos todo homem perfeito em
Cristo” (Cl 1.28). E ele disse à igreja de Éfeso que Deus deu à igreja pessoas
capacitadas “com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para
que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade da fé
e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a
medida da plenitude de Cristo” (Ef 4.12,13). É claramente contrário ao padrão
do NT pensar que o nosso único objetivo com as pessoas é trazê-las à fé
salvadora inicial. Nosso alvo como igreja deve ser apresentar perante Deus todo
cristão “perfeito em Cristo” (CL 1.28).
3. Ministério para com o mundo:
Evangelização
e misericórdia. Jesus disse aos discípulos que eles deveriam fazer “discípulos
de todas as nações” (Mt 28.19). Essa obra evangelística de declarar o evangelho
é o ministério primário que a igreja tem para com o mundo. Todavia, um ministério
de misericórdia deve vir acompanhando o ministério de evangelização, um
ministério que inclua a preocupação com os pobres e necessitados, em nome do
Senhor. Embora a ênfase do NT seja sobre dar ajuda material aos que são parte
da igreja (At 11.29; 2Co 8.4; lJo 3.17), há ainda a afirmação de que é justo
ajudar os descrentes mesmo que eles não respondam com gratidão ou que não
aceitem a mensagem do evangelho. Jesus nos diz: “Amem, porém, os seus inimigos,
façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então,
a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque
ele é bondoso para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, assim como o
pai de vocês é misericordio” (Lc 6.35,36).
O
argumento da explicação de Jesus é que devemos imitar Deus em ser amáveis para
os que são ingratos e maus.
Além
disso, temos o exemplo de Jesus, que não buscou curar somente os que o
aceitaram como Messias. Antes, quando grandes multidões vieram a ele, “ele os
curou, impondo as mãos sobre cada um deles” (Lc 4.40). Isso deveria dar-nos
encorajamento para praticar ações amáveis e orar pela cura e por outras
necessidades na vida dos descrentes assim como na dos crentes. Tais ministérios
de misericórdia ao mundo podem também incluir a participação em atividades
cívicas ou a tentativa de influenciar a política governamental para torná-la
mais compatível com os princípios morais da Bíblia. Nas áreas onde há
sistematicamente injustiça manifestada no tratamento aos pobres, a grupos étnicos
ou ainda a minorias religiosas, a igreja deveria também orar e — à medida que
tem a oportunidade — pregar contra a injustiça. Todos esses são caminhos pelos
quais a igreja pode suplementar o seu ministério evangelístico ao mundo e, de
fato, embelezar o evangelho que professa. Mas tais ministérios de misericórdia
ao mundo nunca devem tornar-se um substituto da genuína evangelização ou de
outras áreas do ministério para com Deus e para com os crentes mencionados
anteriormente.
4. Mantendo esses propósitos em equilíbrio:
Uma
vez que mencionamos esses propósitos para a igreja, alguém poderia perguntar:
“Qual é o mais importante?”. Ou outra pessoa perguntaria: “Poderíamos
considerar um desses três menos importante que os outros?”.
Devemos
responder que os três propósitos da igreja são ordenados por Deus na Escritura;
portanto, todos são importantes e nenhum deles pode ser negligenciado. De fato,
uma igreja forte terá ministérios eficazes nessas três áreas. Devemos nos
precaver contra quaisquer tentativas de reduzir o propósito da igreja a somente
um dos três e dizer que esse deveria ser o foco principal. De fato, tais
tentativas de tornar um dos três propósitos mais importantes sempre resultarão
em alguma negligência dos outros dois.
Contudo,
diferentemente das igrejas, os indivíduos devem estabelecer uma prioridade em
relação a um ou outro desses propósitos da igreja. Porque somos iguais a um
corpo com diversos dons espirituais e capacidades, é correto colocarmos ênfase
maior no cumprimento do propósito da igreja que está relacionado mais de perto
com os dons e interesses que Deus nos deu. Quem tem o dom de evangelização deve
naturalmente gastar algum tempo com a adoração e preocupação com os crentes,
mas pode acabar gastando muito mais tempo na obra evangelística. Alguém que é
líder capacitado em matéria de adoração pode dedicar 90% de seu tempo na igreja
à preparação e à condução do culto. Essa é apenas uma resposta apropriada para
a diversidade de dons que Deus nos deu.
Os
propósitos da igreja
Podemos
entender os propósitos da igreja em termos de ministério para com Deus, com os
crentes e com o mundo.
1. Ministério para com Deus:
Adoração.
Em relação a Deus, o propósito da igreja é adorá-lo. Paulo aconselha a igreja
de Colossos:”Cantem salmos,hinos e cânticos espirituais com gratidão a Deus em
seu coração” (Cl 3.16). Deus nos destinou em Cristo e nos separou “a fim de que
nós sejamos para o louvor da sua glória” (Ef 1.12).A adoração na igreja não é
meramente a preparação para algo mais; ela é em si mesma o cumprimento do maior
propósito da igreja com referência ao seu Senhor. Essa é a razão pela qual
Paulo exortou os efésios a aproveitar “ao máximo cada oportunidade”, associando
isso com o mandamento para que se enchessem do Espírito e, então, falassem
entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de
coração ao Senhor” (Ef 5.16-19).
2. Ministério para com os crentes:
Fortalecimento.
Segundo a Escritura, a igreja tem a obrigação de fortalecer os que já são
crentes e edificá-los para chegarem à maturidade da fé. Paulo disse que seu
alvo não era simplesmente trazer pessoas à fé inicial, mas advertir e ensinar
“a cada um com toda a sabedoria, para que apresentemos todo homem perfeito em
Cristo” (Cl 1.28). E ele disse à igreja de Éfeso que Deus deu à igreja pessoas
capacitadas “com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para
que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade da fé
e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a
medida da plenitude de Cristo” (Ef 4.12,13). É claramente contrário ao padrão
do NT pensar que o nosso único objetivo com as pessoas é trazê-las à fé
salvadora inicial. Nosso alvo como igreja deve ser apresentar perante Deus todo
cristão “perfeito em Cristo” (CL 1.28).
3. Ministério para com o mundo:
Evangelização
e misericórdia. Jesus disse aos discípulos que eles deveriam fazer “discípulos
de todas as nações” (Mt 28.19). Essa obra evangelística de declarar o evangelho
é o ministério primário que a igreja tem para com o mundo. Todavia, um
ministério de misericórdia deve vir acompanhando o ministério de evangelização,
um ministério que inclua a preocupação com os pobres e necessitados, em nome do
Senhor. Embora a ênfase do NT seja sobre dar ajuda material aos que são parte
da igreja (At 11.29; 2Co 8.4; lJo 3.17), há ainda a afirmação de que é justo
ajudar os descrentes mesmo que eles não respondam com gratidão ou que não
aceitem a mensagem do evangelho. Jesus nos diz: “Amem, porém, os seus inimigos,
façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então,
a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque
ele é bondoso para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, assim como o
pai de vocês é misericordio” (Lc 6.35,36).
O
argumento da explicação de Jesus é que devemos imitar Deus em ser amáveis para
os que são ingratos e maus.
Além
disso, temos o exemplo de Jesus, que não buscou curar somente os que o
aceitaram como Messias. Antes, quando grandes multidões vieram a ele, “ele os
curou, impondo as mãos sobre cada um deles” (Lc 4.40). Isso deveria dar-nos
encorajamento para praticar ações amáveis e orar pela cura e por outras
necessidades na vida dos descrentes assim como na dos crentes. Tais ministérios
de misericórdia ao mundo podem também incluir a participação em atividades
cívicas ou a tentativa de influenciar a política governamental para torná-la
mais compatível com os princípios morais da Bíblia. Nas áreas onde há sistematicamente
injustiça manifestada no tratamento aos pobres, a grupos étnicos ou ainda a
minorias religiosas, a igreja deveria também orar e — à medida que tem a
oportunidade — pregar contra a injustiça. Todos esses são caminhos pelos quais
a igreja pode suplementar o seu ministério evangelístico ao mundo e, de fato,
embelezar o evangelho que professa. Mas tais ministérios de misericórdia ao
mundo nunca devem tornar-se um substituto da genuína evangelização ou de outras
áreas do ministério para com Deus e para com os crentes mencionados
anteriormente.
4. Mantendo esses propósitos em equilíbrio:
Uma
vez que mencionamos esses propósitos para a igreja, alguém poderia perguntar:
“Qual é o mais importante?”. Ou outra pessoa perguntaria: “Poderíamos
considerar um desses três menos importante que os outros?”.
Devemos
responder que os três propósitos da igreja são ordenados por Deus na Escritura;
portanto, todos são importantes e nenhum deles pode ser negligenciado. De fato,
uma igreja forte terá ministérios eficazes nessas três áreas. Devemos nos
precaver contra quaisquer tentativas de reduzir o propósito da igreja a somente
um dos três e dizer que esse deveria ser o foco principal. De fato, tais
tentativas de tornar um dos três propósitos mais importantes sempre resultarão
em alguma negligência dos outros dois.
Contudo,
diferentemente das igrejas, os indivíduos devem estabelecer uma prioridade em
relação a um ou outro desses propósitos da igreja. Porque somos iguais a um
corpo com diversos dons espirituais e capacidades, é correto colocarmos ênfase
maior no cumprimento do propósito da igreja que está relacionado mais de perto
com os dons e interesses que Deus nos deu. Quem tem o dom de evangelização deve
naturalmente gastar algum tempo com a adoração e preocupação com os crentes,
mas pode acabar gastando muito mais tempo na obra evangelística. Alguém que é
líder capacitado em matéria de adoração pode dedicar 90% de seu tempo na igreja
à preparação e à condução do culto. Essa é apenas uma resposta apropriada para
a diversidade de dons que Deus nos deu.
Teologia
Sistemática.
Wayne
Grudem.
Ed.
Vida.
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013
A
oração
• Por que Deus
quer que nós oremos?
• Como podemos
orar de modo eficaz?
1. EXPLICAÇÃO E
BASE BÍBLICA
O
caráter de Deus e o seu relacionamento com o mundo, conforme discussão nos
capítulos anteriores, naturalmente conduzem à consideração da doutrina da
oração. A oração pode ser definida da seguinte maneira: A oração é nossa comunicação
pessoal com Deus.
Essa
definição é muito ampla. O que chamamos “oração”
inclui orações de pedidos por nós mesmos e por outros (às vezes chamadas orações de petição ou intercessão), confissão de
pecado, adoração, louvor e ação de graças.
A. Por que Deus
quer que oremos?
A
oração não foi instituída para que Deus pudesse descobrir nossas necessidades,
pois Jesus nos diz: “porque o [...] Pai sabe do que vocês precisam, antes mesmo
de o pedirem” (Mt 6.8). Deus quer que oremos porque a oração
expressa nossa confiança nele e é um meio pelo qual nossa confiança nele pode
aumentar. De fato, talvez a ênfase primária do ensino bíblico sobre a oração é
que devemos orar com fé, que significa confiança ou dependência de Deus. Deus,
como nosso Criador, se deleita no fato de que suas criaturas confiam nele, pois
a atitude de dependência é a forma mais apropriada para expressar o
relacionamento entre o Criador e a criatura.
As
primeiras palavras da oração que o Senhor nos ensinou, ”Pai nosso, que estás nos céus!” (Mt 6.9),
admitem nossa dependência de Deus como o Pai sábio e amoroso e também
reconhecem que, de seu trono celestial, ele governa todas as coisas. Muitas
vezes a Escritura enfatiza nossa necessidade de confiar em Deus quando oramos.
Por exemplo, Jesus compara nossa oração ao filho que pede a seu pai um peixe e
um ovo (Lc
11.9-12) e a seguir conclui: “Se vocês, apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos
seus filhos, quanto mais o Pai que está nos céus dará o Espírito Santo a quem o
pedir?” (Lc 11.13). Como os filhos olham para seus pais esperando a
providência deles, assim Deus espera que olhemos para ele em oração. Visto que
Deus é nosso Pai, devemos pedir a ele com fé. Jesus diz: “E tudo o que pedirem em oração, se crerem, vocês
receberão” (Mt 21.22; cf. Mc 11.24; Tg 1.6-8; 5.14,15).
Mas
Deus não quer somente que confiemos nele. Ele também quer que o amemos e
tenhamos comunhão com ele. Essa, então, é a segunda razão pela qual Deus quer
que oremos.
A
oração nos traz à comunhão mais profunda com Deus, e ele nos ama e tem prazer
em nossa comunhão com ele. Quando oramos verdadeiramente, nós como pessoas, na
totalidade de nosso caráter, estamos nos relacionando com Deus como uma pessoa,
na totalidade do seu caráter. Assim, tudo o que pensamos ou sentimos a respeito
de Deus é expresso em nossa oração. É natural que Deus tenha prazer em tal
atividade e dê tanta ênfase a ela e ao relacionamento conosco.
A
terceira razão pela qual Deus quer que oremos é que na oração Deus permite que
nós, como criaturas, fiquemos envolvidos em atividades que são eternamente
importantes. Quando oramos, o avanço do Reino se processa. Desse modo, a oração
nos dá oportunidade de nos envolvermos de modo significativo na obra do Reino
e, assim, dá expressão à nossa espantosa importância como criaturas feitas à
imagem de Deus.
A
quarta razão pela qual Deus quer que oremos é que na oração damos glória a
Deus. A oração em humilde dependência de Deus indica que estamos genuinamente
convencidos de sua sabedoria, amor, bondade e poder.
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B. A eficácia da oração
Como
exatamente a oração funciona? Além de nos fazer bem, será que a oração também
afeta Deus e o mundo?
1. A oração
muitas vezes muda o modo de Deus agir.
Tiago nos diz: “Não
têm, porque não pedem” (Tg 4.2). Ele sugere que a falha em pedir
priva-nos do que Deus, de outra forma, nos teria dado. Nós oramos e Deus
responde. Jesus também diz: “Peçam, e lhes será dado; busquem, e encontrarão; batam, e a
porta lhes será aberta” (Lc 11.9,10). Ele faz a conexão clara entre
procurar coisas de Deus e recebê-las. Quando pedimos, Deus responde.
Isso
acontece muitas vezes no AT. O Senhor declarou a Moisés que ele haveria de
destruir o povo de Israel por causa do seu pecado (Ex 32.9,10): “Moisés, porém, suplicou ao
SENHOR, o seu Deus clamando: ‘O SENHOR [...] Arrepende-te do fogo da tua ira!
Tem piedade, e não tragas este mal sobre o teu povo...”’ (Lx 32.11,12).
Então lemos: “E
sucedeu que o SENHOR arrependeu-se do mal que ameaçara trazer sobre o povo” (Êx
32.14). Moisés orou, e Deus respondeu. Quando Deus ameaça punir seu
povo por seus pecados, ele declara: “Se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar e
orar, buscar a minha face e se afastar dos seus maus caminhos, dos céus o
ouvirei, perdoarei o seu pecado e curarei a sua terra” (2Cr 7.14).
Quando o povo de Deus orar (com humildade e arrependimento), então ele ouvirá
e os perdoará. As orações do povo de Deus claramente afetam o modo como ele
age. De modo semelhante, “se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para
perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda injustiça” (lJo 1.9). Nós
confessamos, e então Deus perdoa.
Se
estivermos realmente convencidos de que a oração muitas vezes muda o modo de
Deus agir e que Deus realmente produz notáveis mudanças no mundo em resposta à
oração (como a Escritura repetidamente nos diz que ele faz), deveremos orar muito
mais do que oramos. Se oramos pouco, é provavelmente porque não cremos
realmente que a oração realiza muita coisa.
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2. A oração
eficaz torna-se possível por nosso mediador, Jesus Cristo.
Porque
somos pecaminosos e Deus é santo, não temos qualquer direito de, por nós
próprios, entrar na presença de Deus. Precisamos de um mediador para estar
entre nós e Deus e para colocar-nos em sua presença. A Escritura claramente
ensina: “Pois
há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus” (lTm
2.5).
Mas
se Jesus é somente mediador entre Deus e o homem, Deus vai ouvir as orações dos
descrentes, os que não confiam em Jesus? A resposta depende do que entendemos
por “ouvir”. Visto que Deus é
onisciente, ele sempre ouve no sentido de que está consciente das orações
feitas pelos descrentes que não vêm a ele por meio de Cristo. Deus pode até, de
vez em quando, responder às orações deles por causa de sua misericórdia e no
desejo de trazê-los à salvação por meio de Cristo. Contudo, em lugar algum Deus prometeu responder
às orações dos descrentes. As únicas orações que ele prometeu “ouvir”, no
sentido de escutar com simpatia e de comprometer-se a responder quando elas são
feitas de acordo com a sua vontade, são as orações dos cristãos feitas por meio
do mediador, Jesus Cristo (cf.Jo 14.6).
Então,
o que dizer a respeito dos crentes do AT? Como poderiam eles vir a Deus por
meio de Jesus, o mediador? A resposta é que a obra de Jesus como nosso mediador
foi representada em sombras pelo sistema sacrificial e pelas ofertas feitas
pelos sacerdotes no templo (Hb 7.23-28; 8.1-6; 9.1-14 etc.). Contudo, não
havia nenhum mérito salvador no sistema de sacrifícios (Hb 10.1-4). Por meio do sistema
sacrificial, os crentes foram aceitos por Deus somente com base na obra futura
de Cristo representada em sombras por aquele sistema (Rm 3.23-26).
A
atividade de Jesus como mediador é vista especificamente em sua obra como
sacerdote: Ele é nosso “grande sumo sacerdote que adentrou os céus”, aquele que “passou por todo tipo de tentação, porém, sem
pecado” (Hb 4.14,15).
Como
beneficiários da nova aliança, não precisamos permanecer “fora do templo”, como todos os
crentes, exceto os sacerdotes, de quem se exigiu isso sob a antiga aliança. Nem
precisamos permanecer fora do “Santo dos Santos” (Hb 9.3), o lugar mais
interior do templo, onde o próprio Deus estava entronizado acima da arca da
aliança e onde somente o sumo sacerdote poderia entrar, apenas uma vez ao ano.
Mas agora, visto que Cristo morreu como o nosso Sumo Sacerdote mediador
(Hb 7.26,27),
ele ganhou para nós intrepidez e acesso à verdadeira presença de Deus. ”Portanto, irmãos,
temos plena confiança para entrar no Santo dos Santos pelo sangue de Jesus” (Hb
10.19), isto é, no Santo Lugar e no Santo dos Santos, a verdadeira
presença do próprio Deus! A obra de mediação de Cristo dá-nos confiança para
aproximar-nos de Deus em oração.
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3. O que
significa orar “em nome de Jesus”?
Jesus
diz: “E eu
farei o que vocês pedirem em meu nome, para que o Pai seja glorificado no
Filho. O que vocês pedirem em meu nome, eu farei” (Jo 14.13,14). Ele
também diz que escolheu seus discípulos “a fim de que o Pai lhes conceda o que pedirem em meu nome”
(Jo 15.16). De modo semelhante, ele diz: “Eu lhes asseguro que meu Pai lhes dará tudo o
que pedirem em meu nome [...] Peçam e receberão, para que a alegria de vocês
seja completa” (Jo 16.23,24; cf. Ef 5.20). Mas o que isso significa?
É
claro que isso não significa simplesmente a adição da cláusula ”em nome de Jesus”
após cada oração, porque Jesus não
disse: “Se
você pedir alguma coisa e acrescentar as palavras em nome de Jesus’, após a sua
oração, então eu farei”. Jesus não está falando meramente a respeito de
adicionar certas palavras como se elas fossem uma espécie de fórmula mágica que
daria poder às nossas orações. De fato, nenhuma das orações
registradas na Escritura tem a frase “em
nome de Jesus” no final delas (v. Mt 6.9-13; At 1.24,25; 4.24-30; 7.59; 9.13,14; 10. 14 ;Ap
6.10; 22.20).
Vir em nome de
alguém significa que outra pessoa nos autorizou a vir com a sua autoridade, não
com a nossa.
Quando Pedro ordena ao homem coxo: “Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, ande” (At 3.6), ele
está apelando para a autoridade de Jesus, não para a própria autoridade. Quando
os membros do Sinédrio perguntaram aos discípulos: “Com que poder ou em nome de quem vocês
fizeram isso?” (At 4.7), eles estavam perguntando: “Com a autoridade de quem vocês fizeram
isso?”. Quando Paulo repreende um espírito imundo “em nome de Jesus Cristo” (At 16.18),
ele torna claro que está fazendo isso
com a autoridade de Jesus, não com a sua. Quando Paulo pronuncia juízo “em nome de nosso Senhor Jesus” (1 Co 5.4) sobre um
membro da igreja que é culpado de imoralidade, está agindo com a autoridade do
Senhor Jesus. Orar em nome de Jesus é, portanto, oração feita com
autorização dele com base em sua obra mediadora por nós.
Em
sentido mais amplo, o “nome” de uma pessoa no mundo antigo representava a própria
pessoa e, portanto, tudo de seu caráter. Ter um “bom nome” (Pv 22.1, RA; Ec 7.1) era
possuir boa reputação.
Assim, o nome de Jesus representa tudo o
que ele é, seu caráter total. Isso significa que orar “em nome de Jesus” não é
somente orar com a sua autoridade, mas também orar de modo que seja condizente
com o seu caráter, que verdadeiramente o represente e reflita sua maneira de
viver e sua própria vontade santa. Orar em nome de Jesus também significa orar
de acordo com o seu caráter. Nesse sentido, orar em nome de Jesus se aproxima
da idéia de orar de acordo com a sua ”vontade” (lJo
5.14,15).
Isso significa
que é errado acrescentar “em nome de Jesus” no final de nossas orações?
Certamente
não é errado, contanto que entendamos o significado dessas palavras e que não é
necessário pronunciá-las. Pode haver algum perigo, contudo, se acrescentamos
essa frase a cada oração pública ou particular que fazemos, pois logo ela se
tornará para as pessoas simplesmente a fórmula à qual atribuímos muito pouco
significado se a pronunciamos sem pensar seriamente sobre ela. Ela pode ser
vista, ao menos por crentes mais jovens, como uma espécie de fórmula mágica que
torna a oração mais eficaz. Para evitar tal entendimento errôneo, provavelmente
seria sábio decidir não usar essa fórmula muitas vezes e expressar o mesmo
pensamento em outras palavras ou simplesmente na abordagem e atitude que temos
para com a oração em geral.
Por exemplo, as orações poderiam começar
assim: “Pai, vimos diante de ti na autoridade do Senhor Jesus, teu Filho” ou
“Pai, não vimos com méritos próprios, mas nos méritos de Jesus Cristo, que nos
convidou a comparecer diante de ti...”, ou “Pai, te agradecemos por perdoares
os nossos pecados e dares acesso ao teu trono pela obra de Jesus Cristo, teu
Filho...”. Em outras ocasiões mesmo esses reconhecimentos formais não devem
ser considerados necessários, à medida que nosso coração perceba continuamente
que é nosso Salvador que nos capacita a orar ao Pai. A oração genuína é
conversa com a pessoa a quem conhecemos bem e que nos conhece. Tal conversa
genuína entre pessoas que se conhecem mutuamente nunca depende do uso de certas
fórmulas ou palavras exigidas, mas é questão de sinceridade em nossa linguagem
e em nosso coração, uma questão de atitudes corretas e de condição de nosso
espírito.
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4. Devemos orar a
Jesus e ao Espírito Santo?
Um
levantamento das orações do NT indica que elas não são usualmente dirigidas a
Deus Filho nem ao Espírito, mas a Deus Pai. Todavia, a mera verificação de tais
orações pode ser ilusória, pois a maioria das orações que temos registradas no
NT é do próprio Jesus, que constantemente orou a Deus Pai, mas naturalmente não
orou a si próprio como Deus Filho. Além disso, no AT, a natureza trinitária de
Deus não foi revelada claramente, e não é de surpreender que não encontremos
muita evidência de oração dirigida diretamente a Deus Filho ou a Deus Espírito
antes do tempo de Cristo.
Embora
haja um padrão claro de oração diretamente dirigida a Deus Pai por intermédio
do Filho (Mt
6.9; Jo 16.23; Ef 5.20), há outras indicações de que a oração
dirigida diretamente a Jesus Cristo também é apropriada. O fato de que foi o
próprio Jesus que escolheu todos os outros apóstolos sugere que a oração em Atos 1.24
seja dirigida a ele: “Senhor, tu conheces o coração de todos. Mostra-nos qual
destes dois tens escolhido”. O agonizante Estevão ora: “Senhor Jesus,
recebe o meu espírito” (At 7.59). A conversa entre Ananias e “o Senhor” em Atos
9.10-16 é com Jesus, porque no versículo 17 Ananias diz a Saulo: “o Senhor Jesus
enviou-me para que você volte a ver...’. A oração “Vem, Senhor” [Maranatha]
(lCo 16.22) é dirigida a Jesus, como a oração registrada em Apocalipse 22.20:
“Vem, Senhor Jesus!”. E Paulo também orou ao “Senhor” em 2Coríntios 12.8 a respeito do seu
espinho na carne.’
Além
disso, o fato de que Jesus é “sumo sacerdote misericordioso e fiel” (Hb 2.17)
que é capaz de “compadecer-se
das nossas fraquezas” (Hb 4.15) é encorajamento para virmos
ousadamente perante o “trono da graça” em oração “a fim de recebermos misericórdia e
encontrarmos graça que nos ajude no momento da necessidade” (Hb 4.16).
Esses versículos devem incentivar-nos a vir diretamente a Jesus em oração,
esperando que ele simpatize com as nossas fraquezas à medida que oramos.
Há,
portanto, autorização escriturística suficiente para encorajar-nos a orar não
somente a Deus Pai (que parece ser o
padrão primário e certamente segue o exemplo que Jesus nos ensinou na oração do
Senhor), mas também a orar diretamente a Deus Filho, nosso Senhor Jesus
Cristo. Ambos os caminhos estão corretos, e, assim, podemos orar tanto ao Pai
quanto ao Filho.
Mas devemos orar
ao Espírito Santo?
Embora nenhuma oração diretamente dirigida ao Espírito Santo tenha sido
registrada no NT, não há nada que proíba tal oração, porque o Espírito Santo,
semelhantemente ao Pai e ao Filho, é plenamente Deus e, portanto, é digno de
oração e poderoso para responder a nossas orações. Ele também se relaciona
conosco de modo pessoal, já que é o “Conselheiro” ou “Consolador” (Jo 14.16,26). Os
crentes “o
conhecem” [‘O nome “Senhor”
(kyrios, no grego) é usado em Atos e nas cartas para referir-se especialmente
ao Senhor Jesus Cristo.] (Jo 14.17), e ele os ensina (cf. Jo 14.26), dá testemunho a nós
de que somos filhos de Deus (Rm 8.16) e pode ser entristecido pelos nossos
pecados (Ef
4.30).Além disso,o Espírito Santo exerce volição pessoal na
distribuição dos dons espirituais, pois “todas essas coisas [os dons], porém, são realizadas pelo
mesmo e único Espírito, e ele as distribui individualmente, a cada um, como
quer” (lCo 12.11). Portanto, não parece errado orar diretamente ao
Espírito Santo em certas ocasiões, particularmente quando estamos lhe pedindo
para fazer algo relacionado a áreas especiais de seu ministério e
responsabilidade. Mas esse não é o padrão do NT e não deveria tornar-se a
ênfase dominante em nossa vida de oração.
************************************************************************************************
C. Algumas considerações importantes sobre
a oração eficaz
A
Escritura indica uma gama de considerações que precisam ser levadas em conta se
vamos oferecer a espécie de oração que Deus deseja de nós.
1. Orar de acordo
com a vontade de Deus.
João
nos diz: “Esta é a confiança que temos
ao nos aproximarmos de Deus: se pedirmos alguma coisa de acordo com a vontade
de Deus, ele nos ouvirá. E se sabemos que ele nos ouve em tudo o que pedimos,
sabemos que temos o que dele pedimos” (lJo 5.14,15). Jesus nos ensina a
orar: “seja
feita a tua vontade” (Mt 6.10), e ele próprio nos deu o exemplo,
quando no jardim do Getsêmani orou: ”... não seja como eu quero, mas sim como tu queres” (Mt
26.39).
Mas como sabemos
qual é a vontade de Deus quando oramos? Se o assunto sobre o qual estamos orando tem o
respaldo de uma passagem da Escritura na qual Deus nos dá uma ordem ou uma
declaração direta da sua vontade, então a resposta a essa pergunta é fácil: sua
vontade é que sua Palavra seja obedecida e que seus mandamentos sejam
observados. Devemos buscar a perfeita obediência à vontade moral de Deus na
terra, de modo que a vontade de Deus possa ser feita “assim na terra como no céu” (Mt 6.10). Por essa razão, o conhecimento da Escritura é tremenda ajuda
na oração, capacitando-nos a seguir o padrão dos primeiros cristãos, que
citavam a Escritura enquanto oravam (v.At 4.25,26).
A leitura e a memorização regular da Escritura durante anos vão aumentar a
profundidade, o poder e a sabedoria das orações do cristão. Jesus nos encoraja
a ter suas palavras dentro de nós enquanto oramos, pois ele diz: “Se vocês
permanecerem em mim,e as minhas palavras permanecerem em vocês, pedirão o que
quiserem, e lhes será concedido” (Jo 15.7). ‘Com respeito à adoração
do Espírito Santo, a totalidade da igreja — católicos romanos, ortodoxos e
protestantes — tem unanimemente concordado que ela é apropriada, como afirmado
no Credo niceno, elaborado em 381 d.C.: ”E
cremos no Espírito Santo, Senhor, Doador da Vida, que procede do Pai e do
Filho,o qual com o Pai e o Filho juntamente é adorado e glorificado”. De
modo semelhante, a Confissão de fé de Westminster diz: “O culto religioso deve ser prestado a Deus Pai, o Filho e o Espírito
Santo — e só a ele; não deve ser prestado nem aos anjos, nem aos santos, nem a
qualquer outra criatura” (XXI.2). Muitos hinos em uso há séculos dão Louvor
ao Espírito Santo, tais como o Gloria Patri (“Glória ao Pai, ao Filho e ao
Espírito, como era no princípio, agora e para sempre, por todos os séculos. Amém!”)
ou como a doxologia (“A Deus, supremo benfeitor, anjos e homens dêem Louvor; a Deus, o
Filho, a Deus Pai, e a Deus, Espírito, glória dai. Amém”). Essa prática
é baseada na convicção de que Deus é digno de adoração, e como o Espírito Santo
é plenamente Deus, ele é digno de adoração. Tais palavras de louvor são uma
espécie de oração ao Espírito Santo, e, se elas são apropriadas, parece não
haver razão para pensar que outras espécies de oração ao Espírito Santo não
sejam apropriadas.
Devemos
ter grande confiança em que Deus vai responder a nossas orações quando lhe
pedirmos algo que está de acordo com alguma promessa específica ou mandamento
da Escritura como esse. Em tais casos, sabemos qual é a vontade de Deus, porque
ele a disse para nós, e simplesmente precisamos orar crendo que ele haverá de
responder.
Contudo,
há muitas outras situações na vida em que não sabemos qual é a vontade de Deus.
Podemos não ter certeza de qual ela seja porque nessas situações não se aplica
nenhuma promessa ou mandamento da Escritura, como, por exemplo, se é a vontade de Deus que
aceitemos o emprego para o qual nos candidatamos, ou se vamos ganhar uma
competição esportiva da qual participaremos (uma oração comum entre crianças,
especialmente), ou se seremos escolhidos para exercer algum cargo na igreja, e
assim por diante. Em todos esses casos, tendo maior entendimento da
Escritura, talvez alcancemos alguns princípios gerais dentro dos quais nossas
orações possam ser feitas. Mas, de qualquer forma, muitas vezes temos de
admitir que simplesmente não conhecemos qual é a vontade de Deus. Em tais
casos, devemos procurar por entendimento mais profundo e, assim, orar pelo que
parece melhor para nós, dando as razões ao Senhor pelas quais, em nosso
entendimento da situação, estamos orando dessa maneira. Mas é sempre correto
acrescentar, seja explicitamente seja ao menos na atitude de nosso coração: “No entanto, se eu
estiver errado em pedir tal coisa, e se tal coisa não é agradável a ti, então
faze como parece melhor aos teus olhos”, ou, de modo mais simples, “se é a tua
vontade”. Algumas vezes Deus lhe dará o que você pediu. Outras vezes ele nos
dará entendimento mais profundo ou uma mudança em nosso coração de modo que
sejamos levados a pedir algo diferente. Em outras ocasiões ele não atenderá ao
nosso pedido de forma alguma, mas simplesmente nos indicará que devemos
submeter-nos à sua vontade (v. 2Co 12.9,10).
Alguns
cristãos contrapõem que acrescentar a frase “se é a tua vontade” a nossas
orações “destrói
a nossa fé”. O que realmente acontece é que expressamos incerteza
sobre se a oração que fazemos é ou não a vontade de Deus. Essa incerteza é
adequada quando realmente não sabemos qual é a vontade de Deus, mas em outras
ocasiões ela não é apropriada. Por exemplo, pedir a Deus por sabedoria para
tomar uma decisão e a seguir dizer “se é
a tua vontade me dar sabedoria aqui não é apropriado, pois seria declarar que
não cremos que Deus quis dizer o que disse quando nos ordenou que pedíssemos
com fé e ele atenderia o nosso pedido (“Se algum de vocês tem falta de sabedoria, peça-a a Deus,
que a todos dá livremente, de boa vontade; e lhe será concedida”—Tg 1.5).
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2. Ore com fé.
Jesus
diz: “Tudo o
que vocês pedirem em oração, creiam que já o receberam, e assim lhes sucederá”
(Mc 11.24). Algumas tradições variam, mas o texto grego realmente
diz: “creiam
que já o receberam”. Jesus está certamente dizendo que, quando
pedimos alguma coisa, a espécie de fé que produz resultados é a certeza
estabelecida de que, na hora em que oramos pedindo algo (ou talvez após termos
orado por um período de tempo), Deus concordou em atender ao nosso pedido
específico. Na comunhão pessoal com Deus que acontece na oração genuína, essa
espécie de fé de nossa parte poderia vir somente à medida que Deus nos dá o
senso de certeza de que ele concordou com o nosso pedido. Naturalmente não podemos “estimular” esse tipo
de fé genuína por meio de qualquer espécie de oração frenética ou de grande
esforço emocional para conseguir crer, nem podemos forçar a nós mesmos dizendo
palavras que não cremos ser verdadeiras. Isso é algo que somente
Deus tem poder para nos dar e que ele pode ou não nos conceder cada vez que
oramos. Essa fé que causa certeza muitas vezes acontecerá quando pedirmos a
Deus por algo e, então, esperarmos pacientemente pela resposta.
De
fato, Hebreus
11.1 nos diz que “a fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas
que não vemos”. A fé sobre a qual a Bíblia fala nunca é uma espécie de
pensamento positivo ou uma esperança vaga que não causa nenhum tipo de
fundamento seguro sobre o qual possamos repousar. Ao contrário, ela é confiança
em uma pessoa, o próprio Deus, baseada no fato de que tomamos sua palavra e
confiamos no que ele disse. Essa confiança em Deus ou dependência dele, que
possui também elemento de certeza, é a fé genuína sobre a qual a Bíblia ensina.
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3. Obediência.
Desde
que a oração ocorre dentro de nosso relacionamento com Deus como pessoa,
qualquer coisa em nossa vida que o desagrade será impedimento à oração. O
salmista diz: “Se
eu acalentasse o pecado no coração, o Senhor não me ouviria” (Sl 66.18).
Embora o Senhor, por um lado, deteste “o
sacrifício dos Ímpios”, por outro lado “a oração do justo o agrada” (Pv 15.8). Lemos
novamente que “o
SENHOR [...] ouve a oração dos justos” (Pv 15.29). Mas Deus não está
disposto a favorecer os que rejeitam as suas leis: “Se alguém se recusa a ouvir a lei, até suas
orações serão detestáveis” (Pv 28.9).
O
apóstolo Pedro cita o salmo 34 para afirmar que “... os olhos do Senhor estão sobre os justos
e os seus ouvidos estão atentos à sua oração, mas o rosto do Senhor volta-se
contra os que praticam o mal” (1 Pe 3.12). Visto que os versículos
anteriores encorajam a boa conduta na vida diária, no falar e no afastar-se do
mal para fazer o que é reto, Pedro está dizendo que Deus ouve prontamente as
orações dos que vivem em obediência a ele. De modo semelhante, Pedro adverte os
maridos a viver a vida comum no lar com suas esposas “de forma que não sejam interrompidas a suas
orações” (lPe 3.7). De igual modo, João nos lembra da necessidade de
ter a consciência limpa diante de Deus quando oramos, pois ele diz: “Amados, se o
nosso coração não nos condenar, temos confiança diante de Deus e recebemos dele
tudo o que pedimos, porque obedecemos aos seus mandamentos e fazemos o que lhe
agrada” (lJo 3.21,22).
Ora, esse ensino não deve ser entendido de modo errôneo. Não
precisamos ser completamente livres do pecado diante de Deus para ter as nossas
orações respondidas. Se Deus somente respondesse às nossas orações como pessoas
sem pecado, então ninguém em toda a Bíblia, exceto Jesus, teria tido qualquer
oração respondida. Quando chegamos diante de Deus por meio de sua graça, nos
apresentamos limpos pelo sangue de Cristo (Rm
3.25; 5.9; Ef 2.13; Hb 9.14; lPe 1.2). Todavia, não devemos negligenciar a ênfase bíblica sobre a
santidade pessoal. A oração e a vida santa andam juntas. Há muita expressão de
graça na vida cristã, mas o crescimento na santidade pessoal é também o caminho
para a bênção muito maior, e isso é verdade também com respeito à oração. As
passagens citadas ensinam que, no mais não havendo diferenças, a obediência
mais exata conduzirá à eficácia ainda maior na oração (cf. Hb 12.14; Tg 4.3,4).
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4.
Confissão de pecados.
Porque
a nossa obediência a Deus nunca é perfeita nesta vida, continuamente dependemos
do perdão de nossos pecados. A confissão de pecados é necessária a fim de que Deus
nos perdoe no sentido de restaurar diariamente o seu relacionamento conosco (v. Mt 6.12; lJo 1
.9).Quando oramos, é bom confessarmos todos os pecados conhecidos ao
Senhor e pedir-lhe perdão. Quando esperamos nele, por vezes ele vai trazer à
nossa mente outros pecados que precisam ser confessados. Com respeito aos
pecados dos quais não nos lembramos e dos quais não estamos conscientes, é
apropriado fazer a oração geral de Davi: “Absolve-me dos [erros] que desconheço” (Si 19.12).
Confessar
nossos pecados a outros cristãos em quem confiamos pode trazer-nos certeza de
perdão e encorajamento para vencer o pecado. Tiago relaciona a confissão mútua
à oração, pois na passagem que discute a oração eficaz, ele nos encoraja: “... confessem os
seus pecados uns aos outros e orem uns pelos outros para serem curados. A
oração de um justo é poderosa e eficaz” (Tg 5.16).
5.
Perdoando outros.
Jesus diz: “Pois se perdoarem as ofensas uns dos outros,
o Pai celestial também lhes perdoará. Mas se não perdoarem uns aos outros, o
Pai celestial não lhes perdoará as ofensas” (Mt 6.14,15). De modo
semelhante, Jesus diz: “E quando estiverem orando, se tiverem alguma coisa contra
alguém, perdoem-no, para que também o Pai celestial lhes perdoe os seus pecados”
(Mc 11.25). Nosso Senhor não tem em mente a experiência inicial de
perdão quando somos justificados pela fé, pois isso não diz respeito às orações
que fazemos cada dia (Mt 6.12,14,15). Ele está se referindo antes ao
relacionamento diário com Deus que precisa ser restaurado quando pecamos contra
ele e o desagradamos.
Visto
que a oração supõe o relacionamento com Deus como pessoa, isso não é
surpreendente. Se pecamos contra ele e entristecemos o Espírito Santo (cf. Ef 4.30),
e o pecado não foi perdoado, ele interrompe nosso relacionamento com Deus (cf. Is 59.1,2).Até
que o pecado seja perdoado e o relacionamento seja restaurado, a oração
naturalmente será difícil. Além disso, se não temos perdão em nosso coração em
relação a alguém, não estamos agindo de modo agradável a Deus ou útil a nós.
Assim, Deus declara (Mt 6.12,14,15) que ele se distanciará de nós até
que tenhamos perdoado os outros.
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6. Humildade.
Tiago
nos diz que “Deus
se opõe aos orgulhosos, mas concede graça aos humildes” (Tg 4.6; tb. 1 Pe 5.5).
Entretanto, ele diz: “Humilhem-se diante do Senhor, e ele os exaltará” (Tg 4. l0).A
humildade é, assim, a atitude certa que se deve ter na oração a Deus, ao passo
que o orgulho é totalmente impróprio.
A
parábola de Jesus a respeito do fariseu e do publicano ilustra esse princípio.
Quando o fariseu levantou-se para orar, foi jactancioso: “Deus, eu te agradeço porque não sou como os
outros homens: ladrões, corruptos, adúlteros; nem mesmo como este publicano. Jejuo
duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho” (Lc 18.11,12).
O publicano, ao contrário, “nem ousava olhar para o céu, mas batendo no peito, dizia:
‘Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador”’ (Lc 18.13). Jesus
disse que o publicano “foi para casa justificado diante de Deus”, mas
não o fariseu,”pois
quem se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado” (Lc 18.14).
Por meio dessas palavras Jesus condenou os que, ”para disfarçar, fazem longas orações” (Lc
20.47), e os hipócritas que “gostam de ficar orando em pé nas sinagogas e nas esquinas,
a fim de serem vistos pelos outros” (Mt 6.5).
Deus
é certamente zeloso de sua própria honra. Portanto, ele não se agrada em
responder a orações de orgulhosos que tomam a honra para si mesmos em vez de
dá-la a Deus.A verdadeira humildade perante Deus, que também será refletida em
humildade genuína perante os outros, é necessária para a oração eficaz.
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7. O que dizer a
respeito das orações não respondidas?
Devemos
começar reconhecendo que, ainda que Deus seja Deus e nós sejamos suas
criaturas, deve haver orações que não são respondidas. Isso é porque Deus não
nos revela seus planos sábios para o futuro e, embora as pessoas orem, muitos
eventos não acontecerão até o tempo que Deus tenha decretado. Os judeus oraram
durante séculos pedindo que o Messias viesse, e fizeram bem, mas foi somente “quando chegou a
plenitude do tempo que “Deus enviou seu Filho” (Gl 4.4).A alma dos
mártires no céu, livres do pecado, clamam para que Deus julgue a terra (Ap 6.10), mas Deus não lhes responde imediatamente;
ao contrário, ele lhes diz que esperem “um pouco mais” (Ap 6.11). Fica claro que pode
haver longos períodos de espera durante os quais as orações permanecem sem
resposta porque as pessoas que oram não conhecem o tempo próprio de Deus.
A
oração também poderá não ser respondida porque nem sempre sabemos orar como
convém (Rm
8.26), nem sempre oramos de acordo com a vontade de Deus (Tg 4.3)
e nem sempre pedimos com fé (Tg 1.6-8). E às vezes pensamos que uma solução é
melhor, mas Deus tem um plano melhor, ainda que seja para cumprir o seu
propósito por meio do sofrimento e das adversidades. Sem dúvida José orou seriamente para ser
resgatado do poço e não ser levado para o cativeiro no Egito (Gn 37.23-36), mas muitos anos mais tarde ele descobriu como em todos esses
eventos Deus tomou o mal planejado e “o tornou
em bem” (Gn 50.20).
Quando
enfrentamos o problema das orações não respondidas, temos a companhia de Jesus,
que orou: “Pai,
se queres, afasta de mim este cálice; contudo, não seja feita a minha vontade,
mas a tua” (Lc 22.42). Temos também a companhia de Paulo, que pediu
ao Senhor “três
vezes” para que o seu espinho na carne fosse removido, mas isso não
aconteceu; ao contrário, o Senhor lhe disse: “Minha graça é suficiente para você, pois o
meu poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2Co 12.8,9). Quando a oração
permanece sem resposta, devemos continuar a confiar em que “Deus age em todas as coisas para o bem” (Rm
8.28) e a lançar nossas preocupações sobre ele, sabendo que ele
continuamente cuida de nós (lPe 5.7). Devemos manter na memória que ele dará
força suficiente para cada dia (Dt 33.25) e que ele prometeu: “Nunca o deixarei, nunca o abandonarei” (Hb
13.5; cf. Rm 8.35-39).
Devemos
também continuar a orar. As vezes a resposta longamente esperada pode ser dada
de modo repentino, como aconteceu com Ana após muitos anos esperando um filho (lSm 1.19,20),
ou quando Simeão viu com os próprios olhos o tão esperado Messias vindo ao
templo (Lc
2.25-35).
Mas
há situações em que as orações permanecem sem resposta pela vida toda. Há casos
em que Deus responderá às orações após a morte do crente. Em outros não, mas,
mesmo assim, a fé expressa pelo crente nessas orações e suas expressões
sentidas de amor por Deus e pelas pessoas ainda vão subir como um cheiro
agradável diante do trono de Deus (Ap 5.8; 8.3,4), resultando em “louvor, glória e
honra, quando Jesus Cristo for revelado” (1 Pe 1.7).
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D. Louvor e ação
de graças.
Louvor
e ação de graças a Deus são o elemento essencial da oração. A oração-modelo que
Jesus nos deixou começa com louvor: “Santificado seja o teu nome” (Mt 6.9). Paulo diz
aos filipenses: “Não
andem ansiosos por coisa alguma, mas em tudo, pela oração e súplicas, e com
ação de graças, apresentem seus pedidos a Deus” (Fp 4.6), e aos
colossenses: “Dediquem-se
à oração, estejam alerta e sejam agradecidos” (Cl 4.2).A ação de
graças, exatamente como em outro aspecto da oração, não deveria ser a expressão
mecânica “muito obrigado” de nossa
boca para com Deus, mas a expressão de palavras que refletem a gratidão de
nosso coração. Além disso, nunca devemos pensar que agradecer a Deus pela
resposta de alguma coisa que pedimos possa de alguma forma forçar Deus a nos
dar o que pedimos, pois isso transforma o pedido sincero e genuíno em exigência
que presume que podemos fazer Deus executar o que queremos que ele nos faça.
Tal espírito em nossas orações realmente nega a natureza essencial da oração
como manifestação de nossa dependência de Deus.
Ao
contrário, a espécie de ação de graças que acompanha a oração de modo
apropriado deve expressar gratidão a Deus em todas as circunstâncias, por cada
evento da vida que ele permite que nos aconteça. Quando nossa oração é cheia de
humildade, a simples ação de graças a Deus “em todas as circunstâncias” (lTs 5.18), então
essa oração é aceitável a Deus.
II.
TÓPICOS PARA RECAPITULAÇÃO
1. Dê três razões pelas quais Deus quer
que oremos.
2. De que modo Jesus torna as nossas
orações eficazes?
3. O que significa orar “de acordo com a
vontade de Deus”?
4. Qual é o papel de nossa obediência nas
respostas às orações?
5. Dê três razões pelas quais nossas
orações podem ficar sem resposta.
III. PERGUNTAS PARA APLICAÇÃO PESSOAL
1. Você enfrenta muitas vezes dificuldade
com a oração? Nesse sentido, o que foi útil para você neste capítulo?
2. Quando você experimentou os momentos de
oração mais eficazes em sua vida? Que fatores contribuíram para tornar esses
momentos mais eficazes?
3. Como orar junto com outros cristãos
ajuda e encoraja você (se isso realmente acontece)?
4. Você já tentou alguma vez esperar
silenciosamente perante o Senhor após fazer um pedido muito honesto? Se isso
aconteceu, qual foi o resultado?
5. Você tem um tempo regular diário para
leitura particular da Bíblia e para a oração? Você se distrai às vezes e
volta-se para outras atividades? Quando isso acontece, como as distrações podem
ser vencidas?
IV. PASSAGEM BÍBLICA PARA MEMORIZAR
HEBREUS 4.14-16
Portanto, visto que temos um grande sumo sacerdote que adentrou os
céus, Jesus, o Filho de Deus, apeguemo-nos com toda a firmeza à fé que
professamos, pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das
nossas fraquezas, mas sim alguém que, como nós, passou por todo tipo de
tentação, porém, sem pecado. Assim, aproximemo-nos do trono da graça com toda a
confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça que nos ajude
no momento da necessidade.
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